quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

O comunismo nos dias de hoje

Por Adelson Vidal Alves


A revolução russa de 1917, junto com a Primeira grande guerra, abriu o breve século XX, para usar o termo do renomado historiador Eric Hobsbawn.  Sua derrocada, ainda, encerrou o mesmo século, quando em 1991 a URSS é desintegrada e a longa disputa ideológica da Guerra fria se encerra. O golpe do fim do regime soviético atingiu todo o movimento comunista internacional, que desde então, nunca mais foi o mesmo.

Nos dias atuais poucos países reivindicam-se comunistas. São os casos da Coreia do Norte, China e Cuba. Em comum, o fato de manterem o unipartidarismo e o autoritarismo político. Com exceção da China, integrada a globalização, mantém-se fechados ao mundo e passando por grandes dificuldades econômicas. Os mais direitistas diriam que o comunismo está morto. Estaria mesmo?

É fato que a grande parte das análises sobre os erros na história do comunismo do Leste europeu formam o consenso de que a ausência de democracia foi fator importante para o fracasso desta experiência. Ao contrário do que defendia Karl Marx, fundador do socialismo científico, os governos do chamado “socialismo realmente existente” apostaram na força coerciva do Estado como mecanismo de transição para uma sociedade pós-capitalista. Ignoraram que o comunismo só pode triunfar quando a dimensão coerciva do Estado desaparece e as ferramentas de consenso prevalecem.

Mesmo na Guerra fria assistimos a tentativa de alguns partidos comunistas de combinarem democracia e socialismo. Foi o caso do saudoso Partido Comunista Italiano, o PCI, fundado por Antonio Gramsci, e que insistiu na tese da via italiana ao socialismo. Não só utilizando-se da democracia, mas fazendo dela, como proferiu o secretário geral do PCI, Enrico Berlinguer, terreno no qual deveria se erguer uma legítima sociedade socialista. A guerra de posição, usada pelos comunistas italianos, utilizou alianças pontuais com os democratas cristãos, um compromisso de governo que seria um dia superado pela hegemonia dos comunistas, inaugurando, desta forma, uma sociedade democrática e socialista.

Bem antes, no Chile, uma outra experiência de via democrática ao socialismo mostrava força, com a chamada Unidade Popular Chilena, de Salvador Allende, que só não foi mais longe por interferência direta dos EUA com um golpe militar.


O Comunismo que está em crise nos dias atuais é exatamente o comunismo autoritário e inspirado no velho marxismo-leninismo. O sonho de uma sociedade igualitária e fraterna permanece vivo, e os comunistas, cada vez mais, vão se convencendo da centralidade da democracia na preocupação das forças progressistas. Os que ainda insistem na ditadura do proletariado, no centralismo democrático e em revolucionarismos insurrecionais acabam sendo anacrônicos, saudosistas e sem nada a contribuir para os tempos modernos, onde a principal conquista foi a consolidação da democracia como valor universal e o Estado democrático de direito como forma superior de organização social. A mais avançada que conseguimos construir até hoje. 

domingo, 14 de dezembro de 2014

Esquerda em Volta Redonda, hoje

Por Adelson Vidal Alves


A cidade de Volta Redonda sediou uma série de lutas das classes subalternas. A mais importante delas foi a greve de 1988, que deixou três vitimas fatais, assassinadas pelo exército. Por aqui, uma série de organizações da sociedade civil protagonizaram e interferiram na construção do imaginário de uma cidade antes operária e hoje cada vez mais prestadora de serviços. O sindicalismo metalúrgico, classista e combativo, foi tão forte que fez um operário, Juarez Antunes, ascender a prefeitura da cidade. Por uma fatalidade, ficou menos de dois meses no poder.

Nunca pudemos ter, assim, um governo de esquerda. Também não tivemos um de direita, nem mesmo Wanildo. Percorremos anos no chamado centro político, que, com suas variáveis, modernizaram a cidade e resolveram a maior parte dos problemas sociais que assolam muitas cidades do país. Malgrado a dívida que os governos vem mantendo com os servidores públicos, Volta Redonda apresenta índices sociais muito bons.

Mas e a esquerda? Como se comportou nestes tempos? Qual sua realidade hoje?

É perceptível o encolhimento, tanto da esquerda política como social, nos últimos 20 anos. A década de 1990, com a implantação das chamadas reformas de Estado de FHC e também com a privatização da CSN, fez as forças conservadoras ganharem terreno e a esquerda se fragmentar. Em alguns casos, com a profissionalização de movimentos sociais, penou-se o transformismo.  

Hoje, o sindicalismo metalúrgico se curvou à concepção economicista de resultados, as associações de bairro perderam a autonomia e hoje se aglomeram numa entidade autoritária, a FAM (presidida há anos por uma mesma pessoa com cargo no governo). O movimento estudantil se trancou nos muros das universidades e escolas, e o sindicalismo em geral oscila entre radicalismos estéreis e paralisias.

Os partidos políticos, então, foram os mais atingidos pela crise. O PT até que sobreviveu, mas com poucos quadros qualificados, tendo emplacado um vice-prefeito sem apoio consensual do partido. O PCdoB, que dirigiu anos o movimento estudantil e influenciou nas oposições sindicais, hoje se resume a pequenos cargos no governo e com apenas um parlamentar na Câmara, ainda sim, com poucas ligações ideológicas. Perdeu quase todas as entidades de base.

Com crescimento, apenas o PSOL, que soube melhor aproveitar os ventos rebeldes de Junho e aumentar suas fileiras na juventude, recrutando espíritos inquietos e remanescentes das famosas Jornadas de 2013.  Mantém, entretanto, modesto crescimento eleitoral, e está longe de  se firmar como um partido com vocação de governo.

PSB, PDT e PPS sobrevivem, com este último fazendo um esforço de reestruturação, mas ainda sofrendo com a cultura despolitizada que contamina o município.

É grave, assim, que não só as esquerdas estejam em crise. Mas é notório e preocupante a ausência quase que total de uma esquerda democrática, renovada com seu compromisso pela democracia e o Estado de direito. A hegemonia de grupos conservadores, em disputa com esquerdas cooptadas e radicalizadas, parece ser o resumo da luta ideológica na cidade, que está esvaziada, atingida pela prevalência da pequena política. Talvez fosse a hora da esquerda compreender a necessidade de se autotransformar, abandonar sectarismos e dogmatismos, e ingressar de vez no terreno democrático, como sendo ele o exclusivo lugar da luta pelas transformações que historicamente ela defende. 

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

A fé do Jesus histórico

Por Adelson Vidal Alves



Ele influencia bilhões de pessoas em todo mundo, e ainda hoje é um enigma para os historiadores. O homem que dividiu a história do ocidente, literalmente ao meio, ainda é objeto de debates entre teólogos, cientistas e pessoas comuns. Cada qual a sua maneira entrega devoção a Jesus, o “Cristo” para alguns, o filho de Deus enviado em sacrifício pelos pecados da humanidade. Aquele que ressuscitou ao terceiro dia e há de vir julgar vivos e mortos. Para outros, porém, é um espírito evoluído, ou apenas um profeta entre tantos.

Mas o Jesus que a ciência investiga talvez caísse para trás caso voltasse a terra e se defrontasse com a doutrina mais difundida sobre sua pessoa. Pesquisas recentes, na arqueologia, na historiografia e na filologia, demonstram que Jesus jamais teve a pretensão de fundar uma Igreja. Sua intenção, no máximo, seria a de reformar o judaísmo. Membro dos movimentos milenaristas acreditava no fim dos tempos para breve, por isso não pensou numa religião peregrina. O fim do mundo, para o Jesus histórico, seria questão de dias.

Ele também não se entregou espontaneamente à morte, que foi consequência de sua atuação política (por isso morreu na cruz, e não por apedrejamento, pena guardada aos hereges). Incomodou mais Roma que a elite judaica. Aliás, a cena da troca de Pilatos por Jesus não tem registro nos costumes hebraicos. Provavelmente, ela foi obra dos evangelistas que, temendo perseguição de Roma, preferiram um Pilatos “que lavava as mãos por um inocente” ao sanguinário implacável que revela os documentos encontrados recentemente.  Os Judeus foram então responsabilizados.

A fé de Jesus estava em perfeita conformidade com o Judaismo, salvo por seu apreço aos mais pobres, colocados no centro de sua mensagem. Não tinha a intenção de salvar o mundo com sua morte, tal consciência é obra de interpretação das comunidades cristãs, que necessitavam de uma justificativa para a morte humilhante do Messias que deveria salvar Israel. A ressurreição, também, seria outra forma de apaziguar o fracasso de Jesus.

Sim, pois seu empenho em construir o Reino de Deus fracassou. Poucos acolheram sua mensagem. A falta de documentos extra-evangélicos, comprovam que sua caminhada entre nós foi percebida por uma pequena minoria. O nosso Jesus era apenas um entre tantos outros que se reivindicava Cristo.  

O Jesus que nos revela a história é um homem de mensagem simples, indignado com as injustiças de seu tempo, devoto a um Deus que prefere os pobres e repudia a ganância. É o filho de um carpinteiro pobre de Nazaré, que entrou em contato com a vida agrícola (suas parábolas são cheias de alegorias rurais) e que pode ter tido algum acesso a literatura grega. 

Sua morte foi reinterpretada por seus seguidores,  produziu versão mística e ganhou o mundo com Paulo de Tarso, de quem procede a maior parte da doutrina protestante e católica sobre Cristo. Todo o discurso de sua volta ao mundo para buscar a Igreja não deve ter pertencido a sua consciência. Jesus morreu certo de que era mais um a cumprir os mandamentos do Deus Hebreu, jamais imaginaria que bilhões de pessoas ainda o aguardassem de volta e que seria ele o Juiz de todos os nossos destinos. Ainda que atormente a mente de alguns, a simplicidade do Jesus histórico, sem tantos atributos divinos, é bem mais atraente que aquele “Rei dos reis”. O Jesus do presépio é bem mais encantador que o messias poderoso. Por ele, até mesmo os ateus guardam seu apreço.


terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Por uma Polícia sem farda

Por Adelson Vidal Alves



Se buscarmos as primeiras raízes da polícia militarizada no Brasil  chegaremos  a República velha, quando as oligarquias regionais criaram seus grupos armados. Mas a institucionalização da PM acontece em 1969, no auge do terror do regime militar. Hoje, 29 anos depois da redemocratização brasileira, a estrutura das polícias militares seguem as mesmas diretrizes daquele tempo terrível. O treinamento, a cultura e o regimento interno da corporação são de uma entidade montada para guerra, como se nossa vida social se resumisse a guerras. A PM não foi capaz de se atualizar para a vivência democrática e republicana, permanece sustentando a mesma estrutura de uma máquina bélica pronta para liquidar os inimigos.

A Polícia, dentro de uma democracia, deve ser o instrumento da segurança pública, de proteção aos cidadãos contra a criminalidade que oferece riscos a saúde social. Porém, na prática, há a permanência persistente de excessos, que fez o Conselho de direitos humanos da ONU sugerir ao Brasil o fim de sua PM.  Para se ter uma ideia, a chamada “tropa de elite”, o BOPE, em seu treinamento anuncia: “Homens de preto qual é sua missão? Invadir favelas e deixar corpo no chão” uma confissão de assassinato e criminalização da pobreza, dentro dos limites de um órgão de Estado. Uma verdadeira aberração.

A PEC 51, cujo entre os autores está um dos maiores especialistas em segurança pública, o antropólogo Luiz Eduardo Soares, visa abolir a atual PM, e cria possibilidades para a unificação das polícias, que poria fim às desigualdades e rivalidades que existem entre elas. Pois, é bom ressaltarmos, a desmilitarização da Polícia não significa por fim a ela, pelo contrário, busca formas de aperfeiçoamento da instituição. Pesquisas recentes mostram que policiais de baixa patente apoiam o fim da PM, sabem o beneficio que traria para si próprios, seja no trato com a sociedade seja na sua vida profissional. A postura hostil da população em relação a PM é direcionada as práticas autoritárias e violentas que nascem de seu perfil militarizado.


O fim da PM, pronta para guerra e cheia de inimigos e alvos fatais, é um ganho para a sociedade democrática. Não significa ceder ao crime, mas de formatar formas modernas de combate, sem que civis sejam sacrificados pela estratégia truculenta da militarização. O fim da PM seria um ganho para todos, principalmente para os policiais. Difícil entender por que seguimos nos negando a fazer este debate. 

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Um novo governo velho

Por Adelson Vidal Alves



Passada a tempestade eleitoral, que sob o marketing governista repartiu o Brasil por critérios de classe, como se Dilma falasse pelos pobres e Aécio pelos ricos, a presidente reeleita fica a vontade para montar seu novo governo. Pressionada pelo crescimento da oposição e do encolhimento de seu partido e dos aliados mais fiéis, o Planalto se articula para buscar governabilidade. E a se julgar pelas primeiras movimentações, Dilma irá buscar apoio exatamente a quem mais criticou: a tão falada “elite”.

Sim, pois as pastas da Agricultura e da Fazenda serão entregues a intelectuais orgânicos do agronegócio e do sistema financeiro. Kátia Abreu e Joaquim Levy, respectivamente. Este último é pupilo de Armínio Fraga, aliado de Aécio e possível Ministro da Fazenda caso o tucano vencesse. Ambos tem a simpatia do mercado e falam por um modelo  de Estado enxuto, ao gosto do neoliberalismo.

As mudanças que Dilma prometeu pelo slogan “Governo novo, ideias novas” parece ter sido apenas mais uma manobra de eleição, com vista a evitar perdas maiores em um eleitorado que mostrava desejo por mudanças. Dilma não venceu por méritos de seu governo, nem por convencer que sua candidatura era a melhor. Teve que se equilibrar em perfis que não era dela, denegrir adversários, fantasiar passados assombrosos, caluniar, difamar e instalar um clima de terror, a fim de formar a impressão de que seria melhor manter tudo como estava do que arriscar outros caminhos.

Venceu por pouco, e viu sua estratégia, antes infalível no duelo petistas x tucanos, mostrar esgotamento, e assistiu as oposições encorparem com qualidade, absorvendo para dentro dela setores democráticos e progressistas, com o qual terá que duelar no campo das ideias nos próximos quatro anos.  

Salvo os sindicatos e movimentos sociais cooptados, é possível que a manutenção da atual direção do governo afaste dele grupos mais à esquerda, o que o obrigará a procurar ainda mais abrigo nos setores conservadores e fisiológicos da política e da sociedade. Oportunidade para que a oposição apresente, desde já, alternativas para a governança, mostrando que a opção de Dilma por manter a mesma concepção agrícola e econômica da direita é o sinal incontestável que se esgotou como polo progressista de governo. Desta vez, tudo indica que a capitulação do PT será a maior de sua história no poder.


O novo governo velho, com suas formulas envelhecidas, promete modificar o quadro da correlação de forças e da luta de classes no Brasil, assim como redefinir o PT, de uma vez por todas abandonando o pouco que lhe restava de suas utopias de origem. 

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Pedagogia racial

Por Adelson Vidal Alves

Já há algum tempo que o 13 de maio -data da libertação dos escravos- já não é mais festejado pelo movimento negro. Justifica-se que o episódio insinua como protagonista uma branca, a princesa Isabel, que assinou a Lei Áurea abolindo a escravidão negra. Melhor seria ter um herói da cor negra, Zumbi dos Palmares, líder do mais famoso quilombo brasileiro. Celebra-se, assim, o 20 de Novembro, data de sua morte, que já é feriado em parte dos estados do país, como o Rio de Janeiro.

Fato, porém, é que nem Isabel e nem Zumbi foram lá grandes opositores à escravidão negra. A primeira foi beneficiada histórica de um ato que envolveu uma série de atores internos e externos, o segundo lutou para salvar sua pele e de outros negros. O quilombo que liderava mantinha a escravidão e negociava com o mundo escravagista, assim, não tinha nenhuma pretensão de enfrentar o sistema. Mas por que optou-se pelo 20 de Novembro?

Como dito acima, o 13 de Maio favorecia a imagem de uma "heroína" branca e de linhagem real. Não se podia, assim, manipular o imaginário a favor de uma pedagogia racial.  Sem apoio científico para dividir seres humanos em raças, as ONGs e entidades racialistas precisam trabalhar a cultura como fator de pertencimento racial.

O 20 de Novembro ganhou nome sugestivo: Consciência negra. Uma espécie de apelo para que negros se enxerguem como negros, grupo diferenciado frente a uma sociedade separada por raças.  É preciso ostentar o orgulho de pertencer a uma “raça”.  Por isso que alguns professores, lideranças comunitárias, movimentos sociais e intelectuais trabalham a fundo para fazer da data um dia para reflexão de um povo e seus mitos: a mãe África, a cultura dos tambores, etc.  A intenção é formar a unidade da consciência para o falso paradigma da raça.

A data da consciência negra poderia ser apenas mais uma rememoração de uma luta ou de uma liderança histórica. Mas, no fundo, ela foi fabricada e é usada para fins pedagógicos de um movimento que precisa da “raça” como referência de divisão social, sem o qual seus projetos de poder estariam seriamente ameaçados.


quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Desapreço pela democracia

Por Adelson Vidal Alves



Democracia não é coisa, é processo. Está sempre inacabada, e assume feições diferentes no tempo e no espaço. Seu valor universal está na inclusão constante de homens e mulheres na gestão do poder, na participação mais igualitária na distribuição da riqueza como forma de ampliação da cidadania.  Não há, ainda, uma democracia plena, perfeita, mas não nos restam dúvidas que não se trata mais de um valor de classe, concessão penosa à burguesia, mas sim de uma conquista de civilização.

No Brasil, sobretudo a partir de 88, a democracia ganhou corpo avançado no Estado de direito e em sua Constituição, a mais democrática da história. Preocupa-nos, assim, que setores da esquerda e da direita estejam hoje dando sinais de desapreço por esta institucionalidade, repetindo erros de um passado recente trágico, quando a corrida para fazer valer suas teses se davam contornando os limites da regra do jogo,  “na lei ou na marra” como dizia Francisco Julião, líder das ligas Camponesas.

Na ressaca de uma eleição presidencial tensa e agressiva, vemos grupos minoritários solicitando intervenção militar, e como resposta, a esquerda no poder decreta conselhos populares e articula Reforma Política por plebiscito, ações de afronta ao Congresso Nacional. Quando do golpe de 1964, um dos maiores erros dos defensores da legalidade foi o desencontro quanto ao fato de que não havia naquele momento outra bandeira a ser levantada senão a defesa da Constituição de 1946. O sectarismo impediu que a esquerda  enxergasse que seria preferível apoiar, nas eleições de 1965, uma candidatura moderada como a de Juscelino, ou até mesmo de direita como a de Carlos Lacerda, ambos, com suas limitações, seriam infinitamente melhores que os 21 anos de ditadura. Mas até Goulart encantou-se com o poder e as possibilidades reformistas pela via das ruas, e sugeriu manobra para que fosse possível sua reeleição, o que não permitia a Constituição da época.

Voltando aos dias de hoje, penso ser um risco engrossarmos propostas de enfrentamentos diretos, como se o Brasil vivesse uma crise revolucionária. Para os democratas, de esquerda ou liberais, o momento é de reforçar a convicção nacional do Estado democrático de direito como organização social superior no momento, capaz de operar soluções cívicas dos conflitos modernos. Não é saudável importarmos a hostilidade permanente de uma Venezuela chavista, país dividido por ideologias fabricadas sob paranoias e fantasias de ambas as partes.
Cabe-nos, aqui, reconciliar a nação, respeitar a dialética democrática oposição x situação, mas sem jamais entendê-la como exclusivamente antagônica, quando o governo pode acolher propostas da oposição e vice-versa. Caminho difícil quando os ânimos ainda insistem em polarizar dois países em dois partidos: o PSDB dos ricos, paulistas e elitistas contra o PT do Nordeste e dos pobres. Um delírio total quando se percebe que, identificando as divergências, é possível detectar que tratam-se de duas agremiações oriundas da social democracia à brasileira. Caso cessassem sua guerra permanente, o Brasil ganharia, a democracia fortaleceria e consensos democráticos seriam produzidos em um amplo e plural debate nacional.

Lamentável, porém, que a ideia anacrônica de que a democracia é burguesa- e por isso não serve de terreno revolucionário- ainda ganhe adeptos entre a juventude e lutadores populares. Gente que não percebeu que a verdadeira batalha é fortalecer os espaços democráticos, alargá-los para maior participação popular, moralizá-los e fazerem deles territórios de transformação social. Insistir no desapreço pelo Estado de direito é um caminho perigoso, e o apelo é que a unidade das esquerdas, moderados e até conservadores do campo democrático, seja capaz de forçar uma agenda reformista na sociedade, a fim de isolar os autoritários, seja da esquerda ou da direita, e definir, de uma vez por todas, que a democratização e suas instituições são as ferramentas para revoluções no Ocidente.


quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Direito à morte

Por Adelson Vidal Alves



O direito ao suicídio deveria estar previsto em toda Constituição democrática. É direito de qualquer cidadão querer por fim a sua vida quando esta se torna insuportável por torturas físicas, psíquicas ou espirituais. Em alguns casos, deveria ser dever do Estado prestar auxílio.  

O caso recente da americana Brittany Maynard reacendeu o debate quanto ao direito à morte. Com sentença marcada para seis meses, vítima de um câncer terminal, Maynard anunciou seu suicídio assistido, que veio a cumprir no último dia 1 de Novembro. Mas na história há outros casos emblemáticos. Como o caso do frade dominicano Frei Tito. Depois de se integrar a um grupo de resistência armada à ditadura, ele foi capturado e barbaramente torturado pelo delegado Sergio Fleury. Libertado, passou a sofrer com o fantasma de seu algoz, e só viu paz quando enforcou-se em agosto de 1974. Como escreveu seu colega Frei Betto, Frei Tito morreu “para buscar a unidade que havia perdido deste lado da vida”. Por fim, lembro o suicídio de amor praticado pelo filósofo André Gorz, que não suportava ver a dor que sofria sua mulher, vítima de uma doença degenerativa que se somou a um câncer. Por não ver sentido na vida sem ela, praticaram juntos o suicídio.

Em todos estes casos, não se trata de gente “fraca” e “sem fé”, como costumam ser tratado os suicidas. Pelo contrário, há coragem e autonomia, de quem escolhe a morte por consciência. Houve a escolha de não aceitar a vida imposta em condições sofríveis, preferiram o silêncio à dor, simplesmente recusaram-se a seguir vivendo sob estas condições. Não deveríamos tratar a vida como um dever, mas como direito dado a seres inteligentes, com direito a optar por seguir ou não sua jornada.

Claro, há casos em que o suicídio é resultado de patologias. De pessoas que não queriam perder a vida, mas não conseguiram suporte para seguir adiante. São situações em que a sociedade, a família, a escola e as religiões podem reverter. Afinal, muitos chegam a usar o suicídio como grito, grito este que não foi ouvido em vida. São apelos ignorados de quem queria viver, mas não via saída para seus problemas existenciais. Aqui não há uma consciência clara de rejeição à vida, comprovada em casos aonde o próprio suicida chega a se arrepender enquanto agoniza.  Nestas realidades, é possível devolver a vontade de viver, desde que a sociedade saiba ouvir e auxiliar na dor destes seres humanos.


Devermos reconhecer situações diversas no comportamento suicida, a fim de não tratarmos como simples fraqueza de quem o pratica, em alguns casos ele é recurso racional e filosófico. Viver não é um gozo absoluto que se tem direito. A existência pode perfeitamente ser interrompida por quem não se vê mais representado nela, ou quem, simplesmente, tem dela o que ela oferece de pior. A estes o direito à morte é inegociável. 

domingo, 2 de novembro de 2014

Fora Dilma?

Por Adelson Vidal Alves


Faz parte de qualquer democracia avançada a possibilidade permanente da alternância de poder por via eleitoral. O Brasil, que amadureceu sua democracia, de forma mais intensa, a partir da Carta constitucional de 1988, oferece a seu amplo leque de forças políticas a rotatividade política na gestão do Estado, sempre sustentada por regras do jogo que caracterizam o sistema político democrático. Motivo pelo qual, malgrado o nível rebaixado do debate, as eleições de 2014 apresentaram um absoluto sucesso no processo eleitoral, não só na transparência da condução como na rapidez da apuração do resultado. Sendo assim, não tenhamos dúvidas: Dilma foi reeleita presidente da República. Qualquer outra afirmação é delírio, golpismo ou má fé.

Mas o nível de agressividade do debate eleitoral acirrou ânimos, favorecendo reação autoritária tanto por parte dos governistas como de grupos oposicionistas. Os primeiros se apressaram em apresentar projetos que violam a democracia representativa, como o nefasto decreto dos conselhos populares. Já setores anti-Dilma da sociedade civil organizaram manifestações solicitando o impeachment da presidente. Até o PSDB, partido de sólida convicção democrática, cometeu o erro de pedir auditoria nas eleições. O ato foi merecidamente taxado de chororô.

Mais graves são os gritos isolados, mas sem deixar de serem preocupantes, de pessoas sugerindo intervenção militar. Em momentos no qual a polarização ideológica assume contornos extremos, aumenta-se o risco de triunfo autoritário. Não à toa o Rio de Janeiro deu o maior número de votos para a ALERJ e para o Congresso Nacional, a candidatos que assumem versões radicalizadas de esquerda e direita, Marcelo Freixo e Bolsonaro, respectivamente. 

Há um claro sentimento de perda de paciência, que favorece extremos e enfraquece eixos programáticos moderados ou de centro. Aumenta-se a perspectiva de que as soluções devem vir pela força, e não pela busca persistente de caminhos consensuais e democráticos. Pedir a saída da presidente neste momento, como alguns vem fazendo, é condenável. Não se trata de um ataque à Dilma, mas à democracia e o poder constitucional.

Sabemos que o impeachment é recurso legítimo e pertence ao arcabouço jurídico da Constituição, mas violar a vontade popular por denúncias sem comprovações é um equívoco. Se há acusações sérias, que se investigue, mas pronunciar-se por impedimento antes que nossas instituições verifiquem a autenticidade das acusações é golpismo.

Não há no horizonte risco de um golpe que nos leve a uma outra ditadura. Apesar dos acirramentos, a ordem institucional funciona bem, e a memória brasileira desarma qualquer base significativa na sociedade civil que aprove uma intervenção militar.

São vozes tímidas e isoladas, mas a história nos ensina a jamais subestimar caminhos autoritários. A política é imprevisível, e às vezes a surpresa nem sempre é positiva a nível democrático. Vale a pena vigiarmos. 

domingo, 26 de outubro de 2014

Reunificar o Brasil: eis o desafio de Dilma

Por Adelson Vidal Alves



A campanha eleitoral de Dilma investiu numa divisão do país. Pobres e ricos, burgueses e operários, esquerda e direita, nordestinos e paulistas. Tal divisão fazia parte de uma estratégia que visava desqualificar seu adversário como sendo pertencente a uma tal “elite”, conservadora e neoliberal. O objetivo era mostrar que ela, a heroína nacional, seria a pessoa ideal para proteger os pobres contra os ricos.

Apesar de reeleita, a estratégia não funcionou tão bem. Aécio conseguiu 50 milhões de votos (não temos 50 milhões de ricos neoliberais no país) as oposições avançaram no parlamento e nos estados, e sua figura sai enfraquecida dentro de seu partido e de seus aliados. Terá diante de si a tarefa de abrir diálogo com a nação, com os partidos e com a sociedade brasileira. Rachou o Brasil, mas terá que reunificar, com a pena de não conseguir governar. Como fazer isso? A tarefa é árdua, e desafia o próprio perfil de Dilma, profundamente centralizador.

Pela frente, Dilma terá acusações graves de corrupção na Petrobrás, a inflação subindo, o baixo crescimento econômico, a queda dos empregos. Precisará contornar todas estas crises, e restabelecer uma base mínima de governo, social e política.

Venceu dentro de um contexto de tensão, sua campanha insuflou o espírito anti-petista, desmoralizou o olhar que muitos tinham sobre seu partido, visto agora como aquele que faz tudo pra chegar o poder, esvaziado de conteúdo ideológico.

Dilma venceu, mas recebeu uma série de recados das urnas, e se for sensata, dará ouvidos sinceros a estes recados, e aplicará reformulações no governo.


Já o Brasil, assistiu a uma das campanhas mais violentas e deseducadoras da história da república. A festa da democracia foi invadida por gangues da mentira, e saiu com a metade dos convidados em total divórcio com a outra metade. Quem dividiu, tem o a obrigação de reunificar. 

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Breve reflexão sobre educação

Por Adelson Vidal Alves


"Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas".

Rubem Alves



Vejo os debates dos candidatos ao Executivo e percebo que, quando falam de educação, a tratam somente no campo econômico e estatístico (quanto de dinheiro foi destinado à educação, quantos alunos aprovados etc) como se dinheiro formulasse políticas educacionais e aprovações significassem sucesso. A educação é feita, também, de ideias e de sonhos.  De pessoas e não de máquinas. Por isso já vi megaescolas fracassando e pequenos cursinhos dando certo. Tá na hora de pensarmos a educação para além do simples e rotineiro caminho de transferência de verbas para fins aprovativos.

A escola deve ser lugar que incentive sonhos, que forme crianças e jovens para o convívio harmonioso e crítico na sociedade. Isto o IDEB e o ENEM não conseguem medir. 

Escola não é prisão, é jardim, para usar a conhecida metáfora de Rubem Alves. Mas será que estamos regando corretamente nossos jardins? Será que nossa educação faz as flores de nosso jardim crescerem livres e saudáveis? Falando de forma mais direta: será que estamos entregando nossos alunos para sociedade mais felizes, críticos e livres, ou estão doentes pela rígida hierarquização que marca os atuais modelos sociais?

Longe de questionar a necessária rotina curricular, do necessário rigor na aplicação dos conteúdos, da observação séria quanto às regras a serem seguidas. Mas seria de bom senso reconhecermos que sozinhos estes quesitos não são suficientes. Fazem parte de uma pedagogia tradicional fracassada, com reconhecimento até mesmo dos mais altos gestores públicos da educação. Tem que mudar, e isto não há dúvida, mas como e para onde mudar?

Penso que o grande desafio de nós educadores (e do sistema educacional) é conseguir incutir nos alunos o prazer que é a aprendizagem, fazer com que a curiosidade natural de nossas crianças converta-se em mais conhecimento, feito sob a alegria da descoberta das coisas novas. Se conseguirmos fazer nossas crianças descobrirem, por si mesmas, como o conhecimento nos faz voar, teremos sucesso, pois voar é o sonho de toda criança, seja com a imaginação ou com suas utopias.


Não há fórmulas prontas, mas no momento que reconhecemos (retorno a Rubem Alves) que falta à escola o tempero da comida, veremos bons resultados. Hoje conseguimos alimentar nossos alunos com uma comida saudável, mas sem sabor. Se um dia somarmos a comida saudável com a saborosa, a educação cumprirá seu papel. E aos educadores, terão sucesso quando formos cozinheiros e nutricionistas ao mesmo tempo. 

domingo, 19 de outubro de 2014

Vitória de Aécio fortalecerá a esquerda democrática

Por Adelson Vidal Alves


Há uma novidade no realinhamento de forças neste segundo turno presidencial. Pela primeira vez, o PSDB conseguiu mais apoios que o PT, e a maioria de seus novos apoiadores fazem parte do campo da esquerda democrática e dos democratas em geral. Isso se justifica pelas relações conturbadas que os governos petistas mantiveram com as instituições que regem nossa democracia. Houve tentativa de controlar a internet e a mídia, de fazer valer conselhos populares como um poder paralelo, que esvaziaria o papel do Congresso Nacional. Tentaram impedir criação de novos partidos, sabotaram a harmonia dos poderes e aparelharam os movimentos sociais.

Os democratas brasileiros, sobretudo os de esquerda, lançaram um manifesto, que ainda colhe adesões, apoiando Aécio, sabendo que sua vitória abriria possibilidade de que as forças democráticas possam se fortalecer, que a sociedade civil possa agir com total autonomia, que a Constituição seja consagrada como principal programa da esquerda democrática.
Vencendo Dilma, e diante da dura campanha deste segundo turno, haverá uma verdadeira caça as bruxas, e os espaços democráticos poderão se tornar espaços privados de atuação de um só partido. O ambiente será de revanchismo, de fortalecimento de uma governança autoritária, que procure, inclusive, driblar a atual regra do jogo via plebiscito.

Os que defendem o Estado de direito, a busca constante de consensos na resolução dos conflitos modernos, que não incentivam a divisão do Brasil entre ricos e pobres, nordestinos e paulistas, estão com Aécio. Sabem que um projeto nacional que una o país para um desenvolvimento econômico e social com sustentabilidade, passa pela elevação ao poder de forças democráticas e reformistas, capazes de quebrar o ciclo político atual, fundado em políticas sem portas de saída, sem capacidade de mexer nas estruturas, conformando-se a aliviar a miséria por meio de bolsificações.

A vitória de Aécio significa fortalecer um eixo político de centro-esquerda, com núcleo progressista e democrático. Significa recolocar o Brasil numa evolução de democratização de suas instituições e de sua vida social, cultural e política. Por isso e para isso a esquerda democrática, que sai destas eleições mais fortalecida do que nunca, luta pela eleição de Aécio.





terça-feira, 14 de outubro de 2014

Crivella, ameaça ao Estado laico

Por Adelson Vidal Alves



Uma das ameças que rondam a democracia moderna é a persistente tentativa de fusão entre política e religião, acampada por setores conservadores da sociedade brasileira. Não falo apenas pelas bancadas religiosas que atuam livremente no Congresso, orientadas por sua fé e moral. Mas, principalmente, pelo projeto ambicioso de poder que começam a nutrir.

A força deste segmento foi suficiente para barrar avanços em pesquisas científicas e conquistas de direitos civis por parte de minorias. Hoje já dispõe de um partido político, o PRB, uma poderosa rede de televisão, a Record, e outros grandes meios de comunicação. O núcleo deste grupo concentra-se na Igreja Universal, do polêmico Edir Macedo, que recentemente construiu um bilionário templo religioso, o Templo de salomão, numa demonstração clara de força e poder.

As ambições deste grupo chegaram ao Rio de Janeiro, na figura serena do Bispo Marcelo Crivella, sobrinho de Edir Macedo. Ele disputa com Luiz Fernando Pezão o governo do Rio de Janeiro.

Marcelo Crivella, do PRB, não chega a ser dos mais fundamentalistas, mas sua carreira política se construiu com os alicerces da Igreja Universal e seu temível projeto de poder. Temo por religiões de matriz africana, pelos católicos e por homossexuais, caso Crivella vença a eleição. Mesmo sem abrir uma guerra aberta, terá ferramentas para, aos poucos, enfraquecer estes setores com métodos imprevisíveis. Há um risco evidente do Estado laico ser desmontado, pois, segundo eles, o Brasil só terá salvação quando Jesus Cristo for o senhor. Leia-se, o país se tornar protestante, mais especificamente, do segmento ultra-neopentecostal.

Em tempos onde o desafio é consolidar vitórias republicanas, como a democracia representativa e a separação Estado/Igreja, o desafio é garantir a liberdade de crença sem que esla sirva de licença para a "sacralização da política". Enquanto esta última existiu os resultados foram terríveis, e ao contrário do que muitos pensam, o perigo de retrocessos não está descartado.

A população do estado do Rio de Janeiro tem o dever de votar contra o obscuro projeto de poder religioso encarnado em Crivella. É o único caminho para preservarmos a democracia como ela deve ser nos moldes modernos, isto é, suficientemente forte para garantir as escolhas metafísicas individuais sem fazer delas orientação no espaço público, a partir de um poder instalado no Estado.


sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Esquerda, direita e democracia, no segundo turno

Por Adelson Vidal Alves



A polarização deste segundo turno das eleições presidenciais não é esquerda x direita. Aliás, desde 1989 que isso não acontece. PT e PSDB partiram do mesmo ponto: a social-democracia. Ambos foram à direita, e temperaram seus governos com ingredientes do liberalismo econômico, sem, no entanto, jamais terem se tornados “partidos neoliberais”.

Tucanos e petistas negam a naturalização das desigualdades, estão convencidos da necessidade de um Estado forte que promova a igualdade social. Não colocam o bem estar individual acima do bem estar social, e valorizam responsabilidades coletivas. A grande diferença, e é exatamente o que está em jogo neste segundo turno, são as formas de gestão que propõem. Tudo isso passa pela relação que vão manter com a democracia e o Estado de direito. O PT aparelhou estatais, sabotou a harmonia dos poderes republicanos, incentivando a hostilidade contra o STF. Investiu contra liberdade imprensa, através das esdrúxulas tentativas de regular a mídia. Decretou poderes para conselhos populares, driblando o Congresso Nacional e cooptou movimentos sociais.

Aécio, que trouxe para si o apoio de grupos moderados e conservadores, também conseguiu a simpatia de grupos progressistas, instalados em partidos de esquerda como o PSB, PPS e PV. Teve a adesão de uma intelectualidade avançada e de compromissos inegociáveis com a democracia.

O centro deste debate, então, é a democracia. Se votarmos em Dilma, Estaremos aprovando o projeto de eternização do poder, da liquidação de conquistas históricas do Estado democrático de direito, e da oficialização da corrupção como mecanismo legítimo para obtenção de ganhos políticos.

Defender a democracia é votar contra o PT, e votar contra o PT é preferir a alternância do poder, fazer girar o núcleo do poder político. É apostar num novo ciclo político, reformista e democrático, com preocupações cívicas para a vida nacional. É dar um basta no longo ciclo de ineficiência econômica e social, que legou ao Brasil, em 2014, o menor crescimento dos países emergentes.


Votar contra o PT é declarar amor à República e suas conquistas democráticas. 

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Carta a Giovani Miguez


Prezado Giovani Miguez, li a carta que direcionaste a mim, criticando meu artigo “Por que Aécio”. Confesso que fiquei surpreso. Somos amigos há algum tempo, acompanhei seus tempos mais à “direita” (você não precisa concordar com essa minha visão) quando, inclusive, chegou a passar pelo PSDB. Hoje não sei se você veio mais à esquerda ou se foi eu que fui mais à direita. O fato é que nos encontramos em um ponto: a defesa da democracia e o que a representa institucionalmente.

Neste caso, estranha-me que, como um democrata, tenha se deslocado para o lado do partido que mais combate a democracia na história da Segunda Repúblic. Não esperava que viesse automaticamente para o apoio a Aécio, mas sua conversão petista me assustou. Mas, enfim, vamos a sua carta.

Primeiro, achei exagero o uso do “ismo” na minha qualificação. Tratar-me como Aecista, sendo que esta opção é temporária é algo sem sentido. Sabes que o PSDB não é meu partido e Aécio não foi minha primeira opção, o que fiz, como muitos vão fazer neste segundo turno, foi escolher entre as opções postas e que, mantendo firme minha convicção democrata, optei por Aécio sem sinalizar qualquer adesão acrítica a um possível futuro governo tucano.
Na sua carta você taxa o PSDB como neoliberal. Não compartilho com esta afirmação, a não ser que atribua este rótulo também ao PT, pois se os tucanos privatizaram, o PT também privatizou, e se os tucanos mantiveram uma política econômica de exaltação do livre mercado, o PT a repetiu religiosamente. Penso ser mais correto reconhecer traços de liberalismo econômico nos dois lados, sem dar a qualquer um deles o peso do fardo de um “tatcherismo” ou um “reaganismo”.

Quero considerar, ainda, a parte que você atribui ao PSDB o primeiro mensalão, relembrando a suposta compra de votos do Congresso na PEC da reeleição. Ora, aqui há leviandade. Contra FHC não há nenhuma prova, sequer houve uma denúncia que fosse a frente. Um absurdo quando se compara com o mensalão petista, comprovado e com penas já aplicadas da Corte mais alta do país.
Não entendi, também, sua fala em relação ao Bolsa Família, pois em momento algum fui contra o programa. Fiz, sim, críticas, pois a “bolsificação” que falo no artigo trata das correntes que se amarra nos beneficiados do programa, quando este não tem porta de saída, perpetuando a tutela estatal.

Bom, não pretendo me estender, acredito ter, de uma forma geral, respondido os pontos que discordo na sua carta. Saiba que te considero mais que um excelente interlocutor intelectual, mas, principalmente, um amigo.

Abraços,

Adelson Vidal Alves




segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Por que Aécio

Por Adelson Vidal Alves


Porque devemos votar em Aécio neste segundo turno? Primeiro, por que Junho de 2013 e Outubro de 2014 expressaram a exigência de mudanças. Respeitar este sentimento é assumir lado do povo brasileiro. Segundo, por que as instituições democráticas do Brasil vêm sendo, durante o ciclo PT, atacadas com as manobras mais inescrupulosas, a favor de um autoritarismo que encarna a cultura política petista. Terceiro, por que precisamos abrir uma nova governança que substitua a ineficiência do atual governo, que nos entregará o país com crescimento econômico medíocre e risco iminente de inflação.

Há outros motivos a serem considerados. A gestão petista aparelhou as estatais para fins próprios. A Petrobrás pulou das páginas econômicas para as policiais, e os Correios servem como mensageiro exclusivo do PT. Além de aparelhamento há incompetência na direção das estatais, cada vez mais desvalorizadas. A corrupção, câncer histórico de nosso país, foi oficializada pelo Planalto, quando este, ao invés de punir, resolve ele mesmo atacar a suprema corte do país, a fim de proteger seus correligionários.  

Aécio traz como proposta o necessário resgate da democracia institucional. O fim da fusão Estado-Partido, que caracterizou os regimes autoritários do socialismo real, o respeito à harmonia dos poderes e a autonomia dos movimentos sociais. Traz consigo o compromisso de renovar na economia, gerir o Estado ao lado de homens de mérito, e não militantes de um partido.

Votar em Aécio significa votar a favor do pleno funcionamento do Estado de direito, dos valores republicanos e da evolução de uma cultura cívica. Votar em Aécio é ser contra os anos trágicos de gestão petista, que nos fizeram retroceder na vida democrática. Votar em Aécio é demonstrar respeito e apreço por nossa Constituição, hostilizada pela política petista. É votar na esperança de um novo Brasil, onde prevaleça as liberdades democráticas e a justiça social, esta última conseguida com reformas no âmbito do Estado democrático de direito, e não em bolsificações que eternizam a dependência dos cidadãos junto ao Estado. Votar em Aécio é  participar de um ato histórico que libertará a nação de um partido que se assemelha a uma facção criminosa operando no Estado.

Esperamos ver um novo Brasil nascer no próximo dia 26. Para isso não poderá haver dúvidas: Aécio 45.


terça-feira, 30 de setembro de 2014

Dilma, a candidata dos banqueiros

Por Adelson Vidal Alves



Em Outubro de 2002, às vésperas das eleições, Lula lançou a famosa “Carta ao povo brasileiro”. Nela, comprometia-se em manter os contratos com o capital financeiro. Há quem diga que viajou para o exterior e negociou pessoalmente acordos que favoreceriam os grandes bancos em seu mandato. Logo após a posse, nomeou para o Banco Central Henrique Meirelles, ex-executivo do Bank Boston. Mais tarde, aprovou a Reforma da previdência, que favorecia o poder especulativo e prejudicava os aposentados do setor público.

O PT, desde então, dedicou-se a governar sob as bênçãos do sistema financeiro. Dilma, principalmente, foi a que mais encheu as burras dos banqueiros.  Estudo da consultoria Austin Asis, com base nos balanços do primeiro semestre de 2014, mostra elevação de 25,2% do lucro líquido dos bancos privados em comparação com o mesmo período de 2013. Nos três anos de Dilma, o sistema financeiro nacional lucrou R$ 115,75 bilhões. Quase o dobro dos R$ 63,63 bilhões somados em oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso.

Tanta generosidade da presidenta tem justificativa. Na atual campanha presidencial, são os bancos seus maiores financiadores. Em dois meses, segundo o TSE, Dilma arrecadou R$ 123 milhões de reais junto ao sistema financeiro. De todos os presidenciáveis, é a que mais recebeu. O resultado de tanta submissão está nas pífias previsões de crescimento. As mais otimistas apostam em 0,5% neste ano, resultado de uma política econômica que preserva as mais altas taxas de juros do mundo e segue sangrando grande parte do orçamento da União para pagamento da divida pública.

Dilma é a preferida dos banqueiros porque mostrou fidelidade em sua gestão, deixando o BC autônomo de fato. Seguiu com o câmbio flutuante, empossando em altos postos do Estado homens de confiança do capital especulativo.

Porque Dilma não fez a auditoria da divida externa, aliviando e renegociando o gasto anual com a amortização das dívidas? Se assim fizesse, sobraria ainda mais dinheiro para a educação, a saúde e a geração de empregos.  Por que não fez reformas que controlassem o fluxo dos lucros bancários, taxando sua movimentação e aumentando a arrecadação da União? Sua política econômica seguiu desindustrializando, precarizando os empregos, diminuindo os salários, fechando postos de trabalho e aumentando o desemprego.

Hoje aponta para seus adversários a acusação de serem eles os representantes dos bancos, mas os números mostram que, ao contrário do que diz Dilma, é ela a preferida de quem lucrou em seu governo como nunca lucrou na história. Definitivamente, Dilma é a candidata dos banqueiros.


quinta-feira, 25 de setembro de 2014

O lugar de Deus

Por Adelson Vidal Alves


O filme “Deus não está morto”, com direção de Harold Cronk e roteiro de Cary Solomon e Chuck Konzelman relata a história do jovem estudante universitário Josh Wheaton, que encontra na Universidade um arrogante professor de filosofia. Este exige de todos os alunos  a escrita em um fichário do termo “Deus está morto”, obrigando-os a aceitar o ateísmo como verdade absoluta. Wheaton corajosamente se dispõe a defender Deus e aceita o desafio de debater racionalmente com o professor sua existência diante de toda a turma. No final do filme o jovem calouro derrota seu professor, que acaba morto em um acidente de carro, logo após aceitar Jesus. Os ingredientes da trama ainda incluem uma jovem muçulmana que é expulsa de casa logo após seu pai descobrir sua conversão ao cristianismo.

O filme tem tom apologético. Desta forma, não é justo que lhe exija uma crítica para além do que é: mais uma linha de frente de atuação do proselitismo cristão. Isto é, não se pode esperar do filme nada além do que puro louvor ao cristianismo, com o roteiro que repete os cansativos sermões que povoam o vocabulário protestante dominical.

O perigo, no entanto, é que ao alcançar as telas do cinema, filmes deste ramo não se propõem apenas a difundir sua fé, mas desqualificar e até demonizar outras crenças. Em “Deus não está morto” o ateu é apresentado como aquele que rejeitou Deus simplesmente por frustração diante de um fato pessoal. Por sua rebeldia, o personagem perdeu a vida e a esposa. O islamismo é tratado como naturalmente fundamentalista, que passa por cima de sentimentos paternais em nome de uma fé radical. E o pior: o filme tenta demonstrar que o a existência de Deus pode perfeitamente frequentar os laboratórios de ciência e os labirintos racionais da filosofia.

O título da trama, que ironiza a famosa frase de Friedrich Nietzsche “Deus está morto” consagra o caminho que sociedades, como a norte americana, tentam trilhar, ou seja, o de usar da ciência para provar Deus, de fazer das leituras literais da bíblia, em si uma obra com mitos perfeitamente explicáveis para seu tempo, compêndios científicos. A mensagem do filme é clara: a razão e a ciência provam Deus.

Bem longe de querermos fechar o debate sobre a divindade suprema, deveríamos garantir o lugar epistemológico da fé. No momento em que Deus adentra parlamentos, universidades e a medicina, o prejuízo é grande, testemunhos não faltam.  Temos que nos convencer que crer em um ente supremo é de escolha íntima e dispensa provas. Também a ciência não tem qualquer interesse em penetrar espaços metafísicos.

Se há ateus que de fato menosprezam a religiosidade como simples “delírio”, há também quem sofra por sua escolha pessoal. Se há crentes que só querem viver sua fé em conformidade com a diversidade cultural que o cerca, há também quem não se contente com seu rebanho, buscando ampliá-lo por métodos doutrinadores e perigosos. Os ideólogos de “Deus não está morto” pertencem a este último grupo.