quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Democracia no Brasil: 1930 aos dias de hoje

Por Adelson Vidal Alves
 

A chamada “Revolução de 1930” rompeu com o modelo oligárquico implantado na primeira República brasileira. Deslocou-se nosso eixo econômico agrário- exportador em direção a um desenvolvimentismo impulsionado pela industrialização. Novos atores sociais foram chamados à cena, e inaugurada uma nova fase de nosso capitalismo.
            
Sob a direção de Vargas, o Brasil se projetou dentro de uma política que conciliava ganhos para burguesia industrial e avanços nos direitos sociais aos trabalhadores. Nos 15 anos em que Vargas esteve no poder, leis como a que limitava o trabalho infantil e feminino, que concedia férias, regulava jornada de trabalho e introduzia o descanso remunerado, foram criadas em beneficio das classes trabalhadoras. Os Camponeses, contudo, ficaram fora do Pacto varguista.
           
Ainda que os avanços sociais fossem visíveis, a era Vargas ofereceu poucas vantagens a democracia política. Com o golpe do Estado Novo em 1937, o regime político brasileiro recuou nas liberdades civis e políticas. As oposições foram sufocadas, Políticos e sindicalistas cassados, organismos de repressão fortalecidos. Tudo em nome da ideologia corporativista que concentrava no Estado o bem supremo da felicidade social. Todas as entidades de classes foram colocadas debaixo da autoridade do Estado, em constante regime de colaboração, e a luta de classes esvaziada em nome de uma sociedade ilusória de fraternidade social.
            
O fim do regime em 1945 abriu um novo ciclo de redemocratização. Em 1946, foi elaborada uma nova Constituição, com avanços, mas ainda anti-democrática. A nova Carta garantia liberdade de Imprensa e eleição direta para presidente, porém, sem sufrágio universal. Outro ponto autoritário deste ciclo, que se estende a 1964, foi a colocação do PCB na clandestinidade, este que chegou a apoiar o candidato presidencial vitorioso em 1945.

Até a interrupção da democracia em 64, várias tentativas de golpes foram lançadas, em 1954, 1955 e 1961. A última representou a introdução do parlamentarismo no país como forma de garantir a posse de João Goulart, sucessor legítimo ao cargo deixado por Jânio Quadros, que renunciou. O rótulo de comunista sob “Jango” trouxe resistências dos setores conservadores, que por fim concordaram em aceitá-lo em um regime parlamentarista, revogado em 1963 através de plebiscito popular.
           
A posse presidencialista de Jango estava longe de ser um inicio de tranquilidade democrática. A queda de braços entre setores conservadores e de esquerda, jogou Goulart em não raras situações de difícil decisão. Jango se equilibrou dentro de um contexto em que tanto esquerda e direita estavam dispostas a abrir mão do ordenamento democrático para conseguir seus objetivos. Brizola, principal líder das esquerdas, não cansou de aconselhar o presidente a fechar o congresso e impor mudanças pelo uso da força. A tensão e os constantes equívocos das esquerdas, que olhavam o povo pronto para o enfrentamento, fez com que Jango fosse deposto em Março de 1964, logo após assumir as “Reformas de Base” das esquerdas como seu programa político. Iniciava-se um novo e difícil tempo de retrocessos democráticos.

De 1964 a 1985: a ditadura dos quartéis

Durante o Governo Militar, o autoritarismo predominou. Ainda que nos primeiros anos, dirigidos por Castelo Branco, houvesse pequenas liberdades, principalmente no campo cultural, não demorou muito para que o regime recrudescesse, e intensificasse a violência contra a democracia. A chamada “linha castelista” defendia a devolução do poder aos civis assim que estabilizada a ordem. Mas o grupo de Costa e Silva, que substituiu Castelo, avançou nas medidas repressoras, momento em que foi decretado o famoso AI5, no qual as principais liberdades civis eram canceladas, como a emissão de Habeas Corpus.  Com Médici então, a linha dura do governo promoveu um verdadeiro clima de terror no país, através de prisões, torturas, assassinatos e sequestros.

A ditadura, contudo, não sobreviveu apenas com a força, aliás, nenhum regime sobrevive. Durante os governos militares foram ampliados direitos sociais, principalmente em relação ao povo do campo, abandonado até então. Foi criado a seguridade social, a aposentadoria rural e implementado um forte desenvolvimento econômico, que beneficiou principalmente a classe média na compra de bens duráveis. O período de grande crescimento econômico ficou conhecido como “Milagre brasileiro”.

O milagre, todavia, não durou muito. Já no inicio da década de 1970, percebe-se uma estagnação da economia, e consequentemente a perda de bases consensuais ao regime. A oposição consentida, o MDB, avançou nas eleições, forçando a “abertura lenta e segura” para a democracia. Feita sob longas negociações, a transição para democracia assegurou o modelo econômico, a anistia aos militares e garantiu a escolha do novo presidente por via indireta. Ainda sim, o Brasil dava um novo salto em sua democracia.

De 1985 aos dias atuais: a consolidação institucional

A eleição no colégio eleitoral deu vitória a Tancredo Neves, que teve como vice um ex-presidente da ARENA, José Sarney.  Quis o destino que Tancredo viesse a falecer antes da posse, e assim, dando a Sarney o direito de dar rumos ao futuro da Nova República. A democracia conseguiu avanços no Pós-ditadura, ainda que manchados por episódios lamentáveis, quando o que o exército invadiu a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), matando cerca de 3 operários em repressão a uma greve.

Inflação, desemprego e perdas salariais desgastaram o governo Sarney, que fez a transição para a primeira eleição direta da Nova República. Nesta eleição, a polarização do segundo turno entre Fernando Collor (PRN) e Luis Inacio Lula da Silva (PT), representou bem as contradições da sociedade organizada, que já na década de 1980 mostrava ascensão significativa. O primeiro era o nome das elites conservadoras, o segundo, um sindicalista com amplo apoio dos movimentos sociais, e com um programa de mudanças fortes no país. Por uma série de fatores, Collor venceu, e o Brasil inaugurou um novo ciclo político no país, dirigido por um ideário liberal, de diminuição do Estado e amplos processos de privatização. A democracia, contudo, manteve-se.

O presidente veio a sofrer impeachment 2 anos depois de sua posse, sob ampla mobilização popular, logo apóas ser bombardeado por denúncias de corrupção. Devemos lembrar, que mesmo com a governança interrompida, o Brasil não feriu minimamente os contratos democráticos, firmados na avançada Constituição de 1988. As eleições de FHC, Lula e Dilma, foram respaldadas por um sólido e moderno aparelho democrático.

Ainda que a democracia brasileira precise se enriquecer para além de uma concepção representativa, levando em conta elementos econômicos, sociais e culturais, é fato que temos hoje uma institucionalidade democrática forte , pelo qual nenhum tipo de tentativa de ruptura deve ser tolerada, nem pela esquerda, nem pela direita.

REFERÊNCIAS

CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil: longo caminho. Rio de Janeiro:Civilização Brasileira;2012.

FEREIRA, Jorge (org). O Brasil Republicano: o tempo da experiência democrática. Rio e Janeiro: Civilização Brasileira; 2008.

FERREIRA, Jorge (org). O Brasil Republicano: o tempo da ditadura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2008.

LINHARES, Maria Yeda (org). História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Campus;1990


terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Luta pela moradia e a Câmara de Vereadores

Por Ana Paula Rodrigues*



A atividade organizada pelo MNLM - Movimento Nacional de Luta pela Moradia na Câmara Municipal de Volta Redonda, essa semana, para celebrar 2012 como um ano marcado por importantes lutas, e chamar a atenção da população para a reforma urbana no Brasil e no município, foi prejudicada pelo descaso dos gestores da Câmara. O encontro que estava programado para começar as 09h, só pode ser iniciado as 11h por conta das condições precárias que a organização e os participantes do evento tiveram que enfrentar, como por exemplo: equipamentos de som que demoraram a ser disponibilizados, ar-condicionado e bebedouros desligados. 

Um desrespeito, já que as lideranças do movimento enviaram um ofício à câmara, com uma semana de antecedência, solicitando a autorização e os recursos necessários para a realização do evento. 

Frente a essas questões podemos inferir que, a “casa do povo” não está nem um pouco comprometida com as demandas históricas dos moradores pobres e oprimidos do município. 

Pelo contrário, tem se mostrado extremamente sintonizada aos interesses de uma minoria abastada que corrobora a opressão e a falta de democracia na cidade, como no caso do episódio ocorrido a cerca de um mês, na câmara, no qual seria prestada uma homenagem aos militares mortos na década de 30, que foram responsáveis pela repressão aos movimentos sociais na década de 1930 e por matar diversos comunistas. Revelando assim o descaso e a falta de diálogo do parlamento municipal com os movimentos sociais e com a população subalternizada. 

O ato organizado pelo MNLM contou com a participação de 30 lideranças, dos movimentos sociais da cidade, entre, militantes do PSOL, do movimento estudantil, do SEPE VR e do próprio movimento pela moradia de Volta Redonda. 

O encontro contou com a participação especial arquiteto Tiago Souza Bastos (UFF), que apresentou com detalhes o projeto de arquitetura desenvolvido para o terreno onde se encontra a Ocupação 9 de Novembro no bairro Santo Agostinho, que será implementado no local após aprovação do Governo Municipal. 

*Estudante de Serviço Social e diretora de imprensa no SEPE VR.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Manifesto por uma Nova Esquerda

Por Adelson Vidal Alves


A crise estrutural do capitalismo abriu brechas para o reaparecimento de ideologias moribundas de caráter extremista e de direita. Na Europa, avançam as forças neofascistas e tradicionalistas, que começam a interferir diretamente no processo eleitoral. Na França, país onde a esquerda sempre foi forte, assistiu-se a votação expressiva da Frente Nacional (extrema direita), que alcançou 18% dos votos, com direito a vir ocupar cargos ministeriais. Além do mais, o ideário conservador, que inclui xenofobia e extremismo religioso, começa ocupar o programa de partidos de direita, centro, e até mesmo de esquerda.
           
A ausência de alternativas de caráter popular tem levado as grandes massas pobres a se refugiarem em ideologias que elegem o estrangeiro e o secularismo como grandes culpados pelos problemas sociais do mundo. Já parte da esquerda, se esconde em uma ilusão de que as massas se levantarão a qualquer momento para derrubar o sistema.
           
As massas, é verdade, invadem as ruas, protestam, resistem e enfrentam os governos conservadores. Não detém, contudo, uma direção planejada. Não conseguem formular novas formas de poder, não conseguem sequer avançarem para uma pauta propositiva. Pesa o fato de que o povo vai às ruas rejeitando formas tradicionais de organização. Partidos políticos, sindicatos e até movimentos sociais são ignorados como ferramentas de organização popular.
           
A tarefa de se debater uma nova esquerda para os tempos atuais é urgente. Não se pode permanecer nos tempos bolcheviques. É preciso reorganizar um movimento que supere o dogmatismo histórico, que rompa com o vanguardismo, e que seja capaz de abrir diálogo com amplos setores da sociedade.
           
De nada adianta palavras de ordem do século XX, de nada adianta se encolher sectariamente dentro de organizações que só servem para testemunhar a pureza revolucionária. De nada adianta seguir insistindo no operariado como sujeito protagonista de mudanças. De nada adianta perguntar a Marx questões que não são do seu tempo, mas do nosso.
           
Uma esquerda que de fato jogue papel na luta pela hegemonia no século XXI deve começar incorporando em seu programa a democracia como valor inegociável. As estratégias revolucionárias que pretendam assaltar o poder estão em total desconexão com o mundo real, já que as lutas históricas das classes subalternas incluíram a democracia como elemento de combate a ordem do capital. Ao invés de farsa, ela deve ser vista como lugar de onde nasça um novo ordenamento social. Defender e lutar pela ampliação democrática são, assim, lutar diretamente contra o modo de produção capitalista.
           
Uma nova esquerda deve olhar as questões nacionais contextualizadas com o mundo cada vez mais globalizado. Não se pode pensar mudanças locais duradouras sem que venham acompanhadas com mudanças mundiais. Em outras palavras, é preciso pensar um novo internacionalismo.
           
Uma nova esquerda precisa ser flexível em suas alianças políticas. O mundo contemporâneo fez surgir um complexo e plural celeiro de novos atores sociais. Imaginar o proletariado de Marx como linha de frente deste novo bloco de forças anti-sistêmicas seria um erro grosseiro. Imigrantes, negros, mulheres, gays, famintos e miseráveis, demonstram cada dia que passa seu potencial de luta. É preciso entender o lugar de cada um deles na nova luta global, obviamente, sem perder a dimensão de unidade.
           
Pensar uma nova esquerda exige repensar atitudes, entender as movimentações dos grupos em luta, trazer a teoria para o campo de batalha, e principalmente, abandonar verdades e preconceitos. Creio serem estes os primeiros passos para a refundação de uma nova esquerda.
            

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Mídia e mensalão

Por Adelson Vidal Alves

Não há dúvidas que o mensalão existiu. As evidências colhidas pela PGR e o MPF, analisadas minuciosamente pelos magistrados da Suprema Corte, confirmam a existência de um esquema de compra de votos parlamentares em meados do primeiro Governo Lula. Os trâmites para julgarem os envolvidos seguiram os parâmetros do ordenamento democrático. Houve amplo direito de defesa, vindo a ser julgado por 11 Ministros que compõem uma das mais importantes instituições do regime democrático. Estão todos com competência jurídica comprovada, escolhidos em boa parte pelo próprio presidente Lula.

Contudo, a forma como todo o processo do julgamento chega aos ouvidos do povo, tem visível caráter político. Não é de hoje que a grande mídia brasileira tem lado, partidário e de classe. As poucas famílias que dirigem o oligopólio da formação da opinião pública, nunca esconderam suas preferências eleitorais demo-tucanas. No período em que FHC governou o país, serviu muito melhor como advogada do ex-presidente, do que como órgão informativo. Com Lula e o PT, que por suas origens nunca caíram nas graças dessa imprensa, o patrulhamento é rigoroso, e as manipulações perversas.

Se é verdade que o PT abraçou o vale-tudo governamental degenerando-se eticamente, é também verdadeiro que PSDB e DEM tem contra eles indícios de corrupção ainda mais graves que ao Partido dos Trabalhadores, que vão da lista de Furnas até as privatizações criminosas. A mídia, porém, se silencia, e pior, usou recentemente de seus principais editoriais para desqualificar o convite feito pela Câmara dos Deputados a FHC para que se explique  sobre a conhecida lista de Furnas.

Como nessa história não há mocinhos e bandidos, o PT também aciona seus órgãos de mídia para defenderem o governo. Blogs, Jornais e revistas, também usam seu editorial para blindarem a administração petista. Inventaram uma fábula ridícula de que tudo não passava de criação da mídia golpista, interessada em derrubar o governo. Exageram ao tentar demonizar o adversário como forma de acuá-lo. No poder parece ser difícil fazer autocrítica, e chegar à óbvia conclusão de que alguma coisa tá errada nos bastidores do governo, e do partido que o dirige. Simplesmente estão contentes com o lugar que ocupam. A utopia originária morreu.

A grande e triste verdade é que apesar das inclinações parciais e militantes da mídia, a polarização central do poder político se dá por quem não tem nenhum respeito pela República, e muito menos interesse em mudar as coisas. É a hegemonia da pequena política imperando no Brasil. Os sinais de mudanças, no entanto, são cada vez mais raros.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Como e porque derrotar o PT

Por Adelson Vidal Alves




Dilma surpreendeu a todos. Como presidenta não foi uma simples marionete de seu criador, o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva (2002-2010). É verdade que seguiu a risca o pacto Lulista, dirigindo recursos públicos aos setores mais socialmente vulneráveis, ao mesmo tempo em que garantiu o lucro dos grandes capitalistas. A desigualdade social recuou no Brasil, é verdade, mas apenas entre aqueles que vendem sua mão de obra. Na relação Capital/trabalho, as disparidades continuam enormes, como sempre foram em nossa história.
         
Seja como for, o fato é que Dilma firmou sua popularidade e personalidade própria, superando em alguns pontos até mesmo seu padrinho político. A se julgar por seu apoio popular e a ausência de nomes na oposição, será difícil derrotá-la em 2014.  Digo isso, certo que será ela a candidata presidencial do PT, haja vista que Lula parece enfrentar fortes desgastes diante de denúncias de corrupção que envolvem seu nome.

Sendo assim, o que deve fazer a oposição para derrotar o petismo? Investir duro em “denuncismo ético”, a fim de sangrar a candidatura petista? Acredito que não.
            
O julgamento do mensalão em pleno processo eleitoral deixou claro que uma coisa é o povo se indignar com o fato, outra é levar essa indignação para as urnas. O PT saiu quase ileso nestas eleições.

Ainda que se deva acompanhar os claríssimos sinais de desvio ético do governo, cobrando julgamentos republicanos contra os agentes públicos que se corrompem, seria um erro centrar fogo neste quesito como principal programa eleitoral. A oposição tem outros caminhos a pensar.
           
Antes de discutirmos especificamente a atuação oposicionista, devemos compreender que a mesma não é homogênea. Pelo menos três frentes se apresentam para o enfrentamento eleitoral ao governo:
                
A primeira chamaria de “Oposição de direita”, organizada em torno da dupla PSDB/DEM. Estes já têm seu nome lançado: Aécio Neves. O senador mineiro chega à disputa como figura jovem, que traz confiança ao eleitorado, e com difícil associação ao desgastado Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República (1994-2002). Contudo, não saberíamos dizer hoje qual seu alcance nacional. É ainda um quadro regional com potencialidades, que só serão desenvolvidas ao longo de uma possível campanha presidencial.
               
Aécio não chega a ser um neoliberal convicto. Tem se pronunciado por várias vezes em favor da democracia e da preservação de um Estado presente na economia. Todavia, é claramente um político conservador, localizado no campo direitista da política brasileira.
            
A segunda frente ocupa o cenário da esquerda. PSOL, PSTU e PCB, articulam uma alternativa pela esquerda sem ilusões eleitorais. Com o encolhimento de Heloisa Helena, candidata pela frente em 2006, a chamada “Frente de Esquerda” não tem um quadro nacional que realize a função de captar votos. Isso não deve ser visto como fragilidade. Os partidos da frente têm ideologias que passam por fora do simples “personalismo eleitoral”. A campanha de Plínio Arruda de Sampaio em 2010, por exemplo, consolidou uma política de mobilização e educação popular que fez, melhor do que com Heloisa, que a frente colocasse na pauta do processo demandas do país, encobertas por PT/PSDB no debate eleitoral. Há quem diga, contudo, que Marcelo Freixo, que fez uma belíssima campanha para a prefeitura do Rio de Janeiro este ano, deva assumir, ainda sim, a tarefa de líder carismático. Sinceramente, não sei se seria o melhor caminho.
           
O terceiro grupo está ainda em formação. A chamada “Terceira via”, que vem em contraponto tanto ao petismo quanto a direita tradicional, foi ocupada nos últimos anos por figuras de carisma (Heloisa Helena, Marina Silva, Cristovam Buarque etc), sem que possam carregar com elas um projeto equilibrado de caráter programático.

Como deslocar-se para a “Frente de Esquerda”, a princípio, teria resistência dos próprios partidos que a compõe, haja vista a intransigência de fazer concessões programáticas, penso que alguns partidos de centro-esquerda poderiam compor um novo bloco político de oposição. O PPS, aliado de DEM e PSDB nas últimas eleições, poderia acenar para um agrupamento político que seja capaz de levantar bandeiras de esquerda, fazendo pequenas concessões em seus programas históricos. Penso que o PSB, o PV e outras legendas de menor expressão eleitoral, poderiam assumir esta tarefa. Seu programa político se concentraria na proposta de um “Reformismo” que dê conta de mudar a atual relação de forças na sociedade. Levantar bandeiras como a do meio-ambiente, a ampliação da democracia e o respeito a diversidade. Sua composição social se estenderia dos movimentos sociais até a chamada “burguesia produtiva”, passando pela intelectualidade progressista, os setores culturais e a classe média. A idéia seria refazer a proposta do PT em 2002, e colocar o Brasil em uma linha que rompa definitivamente com a hegemonia do sistema financeiro, e abra espaço para o fortalecimento da democracia via universalização dos direitos sociais. Logicamente, a palavra de ordem não seria o “socialismo”. O programa estratégico daria conta de resolver demandas urgentes de nossa questão nacional, como as reformas agrária, tributária e política, apontando para uma democratização mais profunda do país.

O autoritarismo do projeto petista
      
Uma nova vitória do PT concretizaria uma hegemonia histórica, baseada unicamente na busca pelo poder. Com os governos petistas, estabeleceu-se um consenso de desmobilização que atingiu em cheio os movimentos sociais. Por conta de sua política de conciliação, a “Sociedade Civil” brasileira recuou, através da cooptação brutal de seus organismos pelo bloco do poder. CUT, UNE, CTB, CONAM  e até setores do MST, se transformaram em verdadeiras “correias de transmissão” das políticas governamentais. O pacto conservador do lulopetismo esvaziou a luta de classes, freou os enfrentamentos, e criou a ilusão de uma sociedade que avança em harmonia entre as classes sociais.
           
A hegemonia política do PT é enormemente prejudicial para a democracia brasileira. Seu projeto de poder, inclusive, oferece riscos às instituições.

O caso do mensalão, por exemplo, trouxe a público o caráter “golpista” de grupos do partido. Falou-se em convocar protestos de rua contra os resultados do julgamento, e o presidente do legislativo, Deputado Marcos Maia (PT), já disse estar disposto a descumprir as decisões do STF, caso este decida pela cassação imediata dos deputados condenados na AP 470.
          
A estratégia de poder petista, além de capitular movimentos sociais, tem também como ação a utilização da Internet, através de blogs e do facebook, como forma de forjar uma realidade anti-popular e golpista por trás da mídia e do STF. Busca-se assim, desacreditar a imprensa e o judiciário, já que no legislativo conta com maioria. Nada mais perigoso à estabilidade democrática. O PT tem um visível projeto autoritário para o Brasil.

As condições de derrota começam a se criar
            
É verdade que derrotar o petismo não exige apenas força de vontade das oposições. Como vimos, os governos petistas se sustentaram em um pacto que envolve os lucros do capital, a ascensão do proletariado ao mundo do consumo de bens duráveis e a melhoria de vida do subproletariado[1] . Este pacto, entretanto, só é possível na medida em que a situação econômica oferece suas condições. Apesar do baixo crescimento do país nos últimos anos, ele ainda deu margem para que se confirmassem às políticas sociais compensatórias do governo, que foram capazes de formar a principal base eleitoral do Partido dos Trabalhadores, a saber, os setores sociais excluídos. Não é a toa que as vitórias petistas se dão em maior parte nas regiões do Norte e Nordeste, onde a exclusão social é bem mais grave.
           
No entanto, quando olhamos para as condições econômicas mundiais, assim como as previsões de especialistas e do próprio governo, percebemos que nossa economia sofrerá com a crise mundial. O Pacto Lulista, assim, não poderá se sustentar com o mesmo sucesso. O governo terá que cortar no capital ou nas políticas compensatórias. Se optar pelo primeiro quebra a estabilidade governamental, e se atingir o segundo, abre descontentamento e possibilidades para que novas forças sociais penetrem neste grupo dominado pelo Lulismo.
           
A crise do pacto Lulista é eminente, resta saber como as forças oposicionistas irão agir sob esta nova situação.

As possibilidades da oposição

Frente ao desgaste do governo, e a abertura de uma crise em sua base de sustentação, estabelece-se as possibilidades da construção de um novo bloco de poder. Cria-se uma assim uma disputa entre as forças de oposição na busca por hegemonia.
           
Penso que só poderemos falar de mudanças, caso elas se dêem pela esquerda. Uma vitória de DEM ou PSDB, não se caracterizaria como avanço. O ideal seria um amplo diálogo entre as forças de esquerda e de centro, que poderiam construir um projeto alternativo voltado para o aprofundamento da democracia.
            
Os atores sociais deste novo bloco seriam mais amplos, e as alianças pontuais. O objetivo que os uniria seria a quebra da hegemonia petista e a inauguração de um novo ciclo político que atenda as questões nacionais, com atenção específica a um melhor condicionamento na relação de forças de nossa sociedade.
           
O desafio está centrado em derrotar o PT, estabelecendo as condições de avanços para um projeto político progressista de caráter anti-monetarista, isolando a direita e seus aliados do capital financeiro. Só assim, poderíamos avançar na luta por um novo bloco histórico [2].

NOTAS:

[1] Conceito utilizado por André Singer em seu livro “Os Sentidos do Lulismo”, no qual o autor caracteriza uma fração de classe que vive em condições de exclusão, com acesso precário ao mundo do consumo.

[2] Antônio Gramsci entende que as relações entre “Estrutura” e “Superestrutura”, formam uma articulação complexa e dialética que que irão fundar um determinado “Bloco Histórico”. 

domingo, 9 de dezembro de 2012

Democracia burguesa?


Por Adelson Vidal Alves


Dirigente do saudoso PCI, Enrique Berlinguer levantou a bandeira da democracia como valor universal.


Durante as comemorações dos 60 anos da revolução russa, no ano de 1977, o então Secretário Geral do PCI (Partido Comunista Italiano) Enrico Berlinguer proferiu um discurso defendendo o valor universal da democracia. Analisando a situação soviética ele afirmou na ocasião: “A experiência realizada nos levou à conclusão — assim como aconteceu com outros partidos comunistas da Europa capitalista — de que a democracia é hoje não apenas o terreno no qual o adversário de classe é forçado a retroceder, mas é também o valor historicamente universal sobre o qual se deve fundar uma original sociedade socialista”.

O debate quanto ao papel da democracia na luta pelo socialismo chegou ao Brasil no ano de 1979, através de um artigo assinado por Carlos Nelson Coutinho, com o título “A democracia como valor universal”. O texto causou grande polêmica, e foi duramente combatido, tanto pela ditadura quanto pelos chamados “marxistas-leninistas”, que viam na democracia representativa um valor “burguês”, espécie de disfarce para a ditadura do capital.

Vem de Lênin as adjetivações da democracia como “burguesa” e “proletária”. A primeira seria representada pelas eleições parlamentares representativas, e a segunda, expressão da participação direta do povo nas instancias do poder. Obviamente que o teórico russo desconsiderava o valor universal da democracia, talvez pelo fato de que na sociedade em que vivia os espaços institucionais de atuação das classes subalternas eram mínimos. Mesmo assim, Lênin equivocadamente ignora que os organismos representativos como o parlamento, que ele considerava burguês, foram frutos das lutas populares. Os primeiros governos liberais lutaram ferozmente contra a abertura destes espaços. O sufrágio universal, por exemplo, só foi obtido na Inglaterra em  1918, e na França o caminho foi semelhante. Os governos burgueses, assim, não queriam ampliação da participação popular via parlamento.

A ideia de democracia, ou seja, a ideia de uma socialização do poder combinado com a ampliação da cidadania, não combina com os interesses burgueses. É notório que a burguesia lutou e luta contra o fortalecimento da democracia, porque na medida em que ela cresce, seu poder diminui.

Em uma sociedade como a nossa onde os parlamentos são eleitos por sufrágio universal, a imprensa é livre, os sindicatos são economicamente fortes e os partidos políticos plurais, falar em democracia burguesa é empobrecer a realidade e subestimar o poder transformador das instituições modernas.

Vivemos sim sob hegemonia política da burguesia, o que obviamente impede que consigamos de imediato a plena realização democrática. Aliás, a plenitude democrática só pode se concretizar quando a cidadania for universal e as desigualdades extirpadas. Ou seja, somente em uma sociedade socialista.

Contudo, as conquistas populares de participação na gestão do poder não devem ser vistas como simples manipulação burguesa, mas sim como espaços obtidos pela luta direta das classes subalternas, desta forma, sendo desprovidas de valor burguês.