quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Jandira, governadora do Rio



Por Adelson Vidal Alves

O estado do Rio de Janeiro vive um momento de tensão política e institucional. Não só pela estranha epidemia de cassações de prefeitos por ação do TRE no interior do estado, mas principalmente pelo tom violento que desembocou as jornadas de Junho, hoje com a mira apontada para o Palácio das laranjeiras, pressionado por pequenas, mas intensas atividades de rua. Soma-se a isso a incapacidade do governador de estabelecer diálogo com setores da sociedade, e mesmo seus servidores, do qual se destacam os profissionais de educação. O governo do Rio está desorientado em sua quase total inglória missão de refazer seu bloco de sustentação.

O termômetro do fracasso governamental se mede nas últimas pesquisas de opinião. O vice-governador, Luiz Fernando Pezão, é o mais cotado para representar o bloco governista nas eleições, mas ainda não conseguiu decolar nas pesquisas. Ainda que pessoalmente diferenciado de Sérgio Cabral, com mais vocação para diálogos e reconhecida capacidade de gestão, difícil descolar seu nome do desgastado governo Estadual. O resultado político, porém, não favorece o aparecimento de novas forças progressistas postulantes a dirigir o estado. Segundo pesquisa realizada pelo instituto GERP, Marcelo Crivela (PRB), lidera com 23%, seguido por Antony garotinho (PR) 12,8% e Lindberg farias (PT) 7,9%. Os dois primeiros fazem parte de uma emergente força conservadora, instalada a partir dos púlpitos neopentecostais, e alimentada por um fundamentalismo de alta periculosidade ao estado laico. Garotinho, ainda, carrega a ambição de um clã faminta por poder, e envolta em obscuras denúncias de alta corrupção.

A esquerda fluminense tem a difícil tarefa de organizar uma candidatura que dê conta de, responsavelmente, enfrentar os riscos de desaguarmos em 2014 um ciclo conservador, tão ou mais perigoso como o que vivemos hoje. O primeiro passo é conseguir um nome que consiga minimamente passear pelas variações não tão definidas de nossa esquerda, ou mesmo setores democratas moderados. Arrisco-me a apostar na Deputada federal Jandira Feghali. Seu partido, o PCdoB, lançou seu nome, mas goza de pouco entusiasmo mesmo entre seus pares. Seria importante que se estabelecesse um pacto progressista em torno de seu nome, não só para fortalecer sua candidatura, mas também impedir qualquer recuo de seu partido por conta de matemáticas eleitorais.

Não tenho dúvidas que Jandira faria com excelência o contraponto ideal as candidaturas conservadoras, com destaque para aquelas que comungam uma espécie de “direitismo neopentecostal”. Empolgo-me com sua alta capacidade de articulação, sua proximidade com os movimentos sóciais, seu talento para lidar com adversidades e principalmente, a sensibilidade e ética no trato com a coisa pública.

O PT vive uma queda de braços interna, oscilando uma improvável candidatura própria com uma adesão suicida a candidatura do atual governo. A ultraesquerda, sempre indisposta a fazer análise no jogo de forças, tende a apresentar nomes que unicamente testemunham a pureza revolucionária de seus membros. Há outros setores, tais como o PSB, PPS e o PDT que, reconhecendo as particularidades da situação do Estado do Rio de Janeiro, teriam condições de fortalecer um bloco de centro-esquerda.

Sei dos obstáculos, mas penso ser urgente um imediato posicionamento das esquerdas a favor da candidatura de Jandira Feghali.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Onde estão os democratas?



Por Adelson Vidal Alves



 Jorge de Oliveira, o Zoinho, poderá assumir prefeitura mesmo tendo sido rejeitado pela ampla maioria dos votos populares


Onde estão os democratas quando uma cidade inteira padece os imbróglios jurídicos criados por 5 almas distantes do chão de Volta Redonda, envolvidos em capas pretas divinizadas no mais autoritário dos três poderes? Onde estão os democratas quando muitos assistem felizes a possível posse ao executivo de quem foi rejeitado nas urnas pela maioria da população? Onde estão os democratas para cobrar a soberania popular na decisão de escolha de seus governos?

Eles deveriam estar na linha de frente de defesa da Constituição, da instituição de poderes pela via popular, contra qualquer tipo de manobra que fere a estabilidade institucional de uma cidade.  Deveriam deixar as opções pessoais de lado, tomar posição pelas regras do jogo, e apostar na política como construção de vontades coletivas. Se por acaso se calam, sobe o volume fisiológico de setores de nossa sociedade, atiça espíritos golpistas, esparramando entre nós a desgraça do autoritarismo. Constitui-se entre nós um imaginário de que os debates políticos podem simplesmente serem dissolvidos pela vontade imperial de uma divina corte.

Volta Redonda corre o sério risco de repetir uma das mais raras e bizarras reestruturações administrativas. Como na cidade do aço, o estado do Maranhão teve troca de seus gestores sem permissão popular. A Justiça Eleitoral deu poderes imediatos a segunda colocada, Roseana Sarney, logo após de cassar o mandato de Jackson Lago no ano de 2009. Por aqui se repete a esquizofrenia de um estado historicamente contaminado pela cultura oligárquica, porém com um agravante, enquanto lá se passaram mais da metade do mandato do governador cassado, por aqui se passaram pouco mais da metade do primeiro ano de governo. Pelo código eleitoral, em seu artigo 224, a decisão de nosso Tribunal Regional goza de total desapoio.

Algo, porém, deveria preocupar de forma ainda mais grave os democratas. Junto as Champagnes que se estouram em meio à decisão do TRE, freqüentam não só ingênuos netofóbicos, desinformados das perspectivas de futuro, ou altos influentes do círculo que envolve o possível novo prefeito. Também passeia, ainda que fora das áreas VIPs, parte de uma esquerda autodeclarada rebelde, daquelas que pulam catracas e ocupam parlamentos, e criticam instituições por serem estas tão somente “burguesas”. Isoladas em suas seitas sindicais, preferem obter suas conquistas cancelando a democracia. O espírito desta esquerda foi responsável pela fragilização democrática do país no início da década de 60. Neste período, forçaram tensões com o governo de João Goulart, e ao invés de socialismo, o Brasil passou anos de uma longa ditadura dos quartéis.

Sempre que o povo perde protagonismo nas decisões de um país, acende-se o sinal amarelo para os democratas. Em Volta Redonda, estes parecem cada vez mais distantes do jogo político. E caso seu silêncio persista, será de responsabilidade total pelo definhamento democrático de nossa cidade.

Enquanto parcela da sociedade assiste a derrubada de um governo com grande alegria, retrocedemos em nossa cultura política para um ambiente que pensávamos ter ficado para atrás após resistirmos com tanta energia varias intervenções autoritárias (a greve de 1988 por exemplo). Infelizmente, a nova geração cresceu sem as devidas referências democráticas, e a culpa é de todos nós, pelo menos aqueles que elegeram a democracia como palco de resolução dos problemas da vida em sociedade, isto é, os democratas.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Gramsci entre nós



Por Adelson Vidal Alves


                                  

No importante ano de 1922, era fundado no Brasil o PCB (Partido Comunista do Brasil). Tratava-se de um esforço de ingressar no debate político mundial, marcado por uma revolução “proletária” dentro de um grande país com estruturas semi-coloniais, e com uma classe operária em lento desenvolvimento. Sem podermos contar com um partido socialista, a versão brasileira de um partido revolucionário e comunista nasceu no seio anarquista, movimento hegemônico entre os trabalhadores durante o final do século XIX e início do XX. No dia de fundação do partido, os 9 fundadores entoaram em voz baixa a internacional comunista, a fim de não acordar a tia de Astrojildo Pereira,  dona da casa onde se realizou o congresso fundador.

A precariedade dos primeiros passos do PCB não se resumia as questões materiais, mas, sobretudo, teóricas. Os fundamentos de ação dos primeiros comunistas brasileiros vinham dos reflexos da revolução russa, e tinha pouca influência da teoria marxista em sua riqueza natural. Mesmo os intelectuais mais destacados, como o próprio Astrojildo, tiveram enormes dificuldades para adaptar o parco conhecimento do método de Marx a realidade brasileira. O mais ousado entre eles, Octávio Brandão, arriscou uma mal sucedida empreitada em seu trabalho “agrarismo e industrialismo”, onde ainda que tenha trazido elementos interessantes, apenas comprovava a baixa intimidade de nossos primeiros comunistas com a teoria marxista.

A debilidade de nosso marxismo em seus passos iniciais marcou decisões equivocadas e até mesmo trágicas. Impossível não lembrar a bizarra tentativa de revolução em 1935, derrotada em poucos dias, e que serviu de argumento para o aprofundamento do regime ditatorial varguista, inaugurado em 1937 no que veio a ser conhecido como Estado novo. Neste episódio, um dos representantes do partido na III Internacional chegou a relatar que o Brasil vivia uma situação revolucionária, com apoio popular que ia de operários aos cangaceiros de lampião.

A trajetória do PCB, contudo, marcou com competência o desenvolvimento cultural brasileiro, conseguiu interferir nas decisões do movimento operário, e dentro de vários e longos períodos de clandestinidade, mostrou capacidade de renovação, ainda que oscilando entre sectarismos. Fato emblemático foi a declaração de Março de 1958, do qual se fez presente uma correta mudança de concepção da luta política. Saltava-se para uma estratégia alinhada com a democracia política, sem perspectivas insurrecionais. Motivo pelo qual uma parte de seus militantes optou por abandonar a legenda, acusando a de “revisionista’ e “reformista”. A fim de se manterem “revolucionários”, gente como Pedro Pomar, João Amazonas e Mauricio Grabois, fundaram em 1962 o PCdoB, de orientação maoísta. A nova legenda esteve entre aqueles que não viam outro caminho de resistência a ditadura senão pela ação armada. Seus militantes, cerca de 70, se posicionaram ao longo do Rio Araguaia, e foram abatidos com certa facilidade, comprovando o erro da estratégia, ainda que tenhamos que reconhecer a bravura dos que tombaram. Encerro aqui as colocações introdutórias deste artigo, relativamente longas, que objetivaram mostrar a acertada afirmação leninista quanto a necessária relação dialética entre teoria e prática.

Ponto importante na vida do PCB, e agora entro definitivamente na temática central do artigo, foi o acolhimento de um importante teórico em nosso celeiro intelectual. Trata-se de Antônio Gramsci. A recepção das obras do autor se deu entre os intelectuais ligados ao PCB, entre as décadas de 60 e final de 70. Ao desembarcar no Brasil, Gramsci recebeu modesta recepção, suas primeiras introduções viraram peças de sebo. O pouco interesse pela leitura de seu marxismo herético, (resumido erroneamente por muitos como de interesse exclusivo da cultura e não como ferramenta política para as revoluções no ocidente), foi resultado ou causa das estratégias de confronto aberto assumido por nossas esquerdas, que preferiram Marcuse ao pensador sardo. Somente mais tarde, quando a ditadura militar dava sinais de esgotamento, que Gramsci entrou definitivamente entre nós, que verdadeiramente se tornou um ilustre cidadão brasileiro entre as esquerdas. Devemos muito a Carlos Nelson Coutinho, Luiz Sérgio Henriques, Marco Aurélio Nogueira, Ênio Silveira e outros, a chegada definitiva do maior clássico comunista do século XX, capaz de renovar o marxismo brasileiro, antes seduzido pela vulgata soviética e seus pares. As categorias gramscianas caíram como enriquecedoras das nossas produções teórico-revolucionárias. Conseguimos, ainda que modestamente, fortalecer uma esquerda democrática que, com visível influência gramsciana, abandonou por completo perspectivas de insurreição aberta contra o Estado em suas ambições de poder. Temos hoje um núcleo democrático forte, que atua na esteira do estado de direito, obediente a carta republicana e com compromisso inegociável na defesa da democracia e suas regras, entendida como valor universal, e não simplesmente uma ferramenta burguesa contra as classes subalternas.

Gramsci está entre nós, e é impossível ignorá-lo. Seu amplo leque conceitual ajudou em nossas analises nacionais, trazendo luz sobre o processo de ocidentalização, decifrando ainda, as bases estruturais de nossa modernização conservadora. O país das “revoluções passivas” pode se conhecer melhor, intermediado por intervenções competentes de analistas graúdos como o já citado Carlos Nelson Coutinho, Alberto Aggio e o brilhante sociólogo Luiz Werneck Vianna.

Na política, o marxista italiano passeia com liberdade em várias agremiações partidárias. Seus conceitos tem grande peso no PPS, influência relativa em parte do PT e PSOL, chegando até mesmo a ser citado em documentos do PSTU. A abrangência de suas avaliações carcerárias impede que se rejeite Gramsci, principalmente em abordagens sobre educação, filosofia e literatura. Contribuição valorosa, porém, vem de sua teoria política, desenvolvida em obra de maturidade, escrita sob as duras condições da prisão fascista. De passagem, devemos lembrar que dos apontamentos carcerários de Gramsci nasceu sua principal contribuição política para as esquerdas ocidentais. Escritos fragmentados, sobreviveram em cadernos de capa dura e nos chegaram até hoje sob cumplicidade de sua empenhada cunhada Tatiana,  e pela edição de Palmiro Togliatti e Valentino Gerratana, editores temáticos e críticos da obra gramsciana. Nosso autor foi capaz de resolver cativo, as aflições de uma esquerda que ainda não entendia o fracasso da revolução socialista no ocidente do mundo. Veio dele a brilhante constatação de que assaltar o poder estatal só faz sentido na medida em que este “era tudo” e a “sociedade civil primitiva e gelatinosa”. Nas realidades onde o poder se esparramava por uma sociedade civil plural e forte, a decisão do processo revolucionário caminhava em busca de uma hegemonia civil, travada por dentro dos “aparelhos privados de hegemonia’ numa intensa busca de direção cultural.

A afirmativa de que revoluções no ocidente só se processam em longas e graduais lutas de posição, contaminou os setores da esquerda mais avançada do Brasil, que prontamente elegeu a democracia como palco de mudanças estruturais. Esta esquerda desabona tomar o “Palácio de Inverno” e não incita ações diretas pelo poder, antes optam por “fazer política”, construir amplas alianças, avançar e recuar na “guerra de posição”, e tem como convicção inabalável que a construção de outra ordem social exige mais que simplificadas ações militares.

A permanência fixa de Gramsci em nosso país é um remédio vital contra os desvios sectários que povoam a história nacional. Ainda que teime em sobreviver os adeptos da “guerra de manobra”, a persistência gramsciana foi mais que suficiente pra fazer nascer entre nós uma sólida e perspicaz força política, que marxista ou não, toma a democracia como valor de civilização, palco pelo qual se desenha constantemente o processo de humanização de nossa vida social.  E isto não é pouco.

 

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Vandalismo revolucionário?



Por Adelson Vidal Alves


A maioria dos brasileiros nunca tinha ouvido falar dos Black Blocs, o grupo que age violentamente nas últimas manifestações de rua. Estes pegaram carona nas Jornadas de Junho, que mobilizaram milhões de pessoas em todo o país, e hoje conseguem relativa popularidade junto a setores da extrema-esquerda e extrema direita. O uso da violência como forma de “ação direta” e propaganda, é defendida pelos seus membros. Dizem ser necessário quebrar bancos, multinacionais, considerados símbolos do capitalismo. A violência desmedida, no entanto, chega a danificar patrimônio público, pequenos bens privados e até mesmo propriedades comerciais de médio porte, como padarias, bancas de jornal e barraquinhas de Itapioca. Os “revolucionários” Black Blocs devem considerar todos representantes do capitalismo.

Lembro de um livro, escrito por Hannah Arendt, chamado “Sobre a violência”. A filósofa Judia, refugiada do Nazismo, escreveu esta obra no bojo das revoltas estudantis de 1968, e defendeu a separação absoluta de violência e poder. Discordando de uma frase de Mao Tse Tung, segundo o qual “o poder nasce do cana de uma arma”, Arendt estabelece a violência como o momento em que o poder, (entendida por ela como dominação pela via consensual) desaparece. Segundo a filósofa, onde há violência não existe poder, e onde há poder não há violência.

Antes dela um importante teórico marxista já havia escrito sobre os caminhos revolucionários por mecanismos de consenso. O Italiano Antônio Gramsci (1891-1937), afirmava que na medida em que o poder se tornou complexo e acessível às massas, faz-se necessário pensar mudanças não mais pelo uso violento de assalto ao Estado, mas sim uma busca constante pela hegemonia, isto é, a direção cultural de uma sociedade. Apesar de se distanciarem no campo teórico, tanto a filósofa alemã como o pensador italiano, sabiam distinguir o poder para além da equação: Poder=Violência.

Voltando aos Black Blocs, estes chegam a advogar um anarquismo, que mais se parece com uma espécie de neo-ludismo (o ludismo foi um movimento do século XIX que destruía máquinas culpando estas como o maior problema dos trabalhadores). No entanto, conseguem a simpatia até mesmo de quem se diz marxista. Debati com um colega, que me garantiu que em Marx é a violência a razão pelo qual as revoluções acontecem. Rebati dizendo que o pensador alemão considerava os processos revolucionários como fruto das contradições sociais, não da ação violenta. É verdade que este chegou a admitir que a violência pudesse preceder uma revolução, mas não podemos esquecer que também levou em conta a possibilidade de revoluções pacíficas em países mais avançados.

A proposta revolucionária dos Black Blocs, se é que ela existe de fato, vem de encontro aos interesses da burguesia, que se utilizam da mídia para jogar a opinião pública contra manifestações legítimas. Pichar e depredar patrimônio, mesmo os que respondem pela alta acumulação capitalista, não são ferramentas eficientes para mudanças significativas na ordem social. São sim, vandalismos, típicos de quem, pela esquerda ou pela direita, não engoliu o processo civilizatório do qual o estado de direito é sua maior expressão.