sábado, 17 de agosto de 2013

O direito de abortar




Por Adelson Vidal Alves

O Brasil segue envolto a um debate polêmico: a descriminalização do aborto. Ao contrário de outras temáticas complexas que ocupam a pauta do Congresso Nacional, esta guarda a dificuldade de se dar em meio a bancadas parlamentares religiosas fundamentalistas e sob intensa pressão da Igreja. A sociedade civil é palco de campanhas deseducadoras, que de forma apelativa expõe fotos de bebês formados mortos, quando em nenhum país onde o aborto não seja crime, a permissão abortiva supera 3 meses de gestação, ou seja, quando o feto ainda não tomou a forma humanoide.

A dura realidade é que a criminalização do aborto não protege a vida, pelo contrário, tornou-se uma fábrica de morte para mulheres de baixa renda.  Segundo a Pesquisa Nacional do Aborto, realizada em 2010, a maioria daquelas que abortam ganham entre 0 e 2 salários mínimos. Ou seja, com a ausência de uma estrutura que dê segurança a estas mulheres na saúde pública, elas recorrem a métodos arriscados e clandestinos, que não raras vezes levam a óbito. Já as ricas conseguem acesso a práticas abortivas bem mais seguras. Um Estado laico e democrático não pode ignorar esta realidade.

Os argumentos que criminalizam o aborto quase sempre recebem roupagem religiosa. Na cabeça de um cristão fundamentalista, a vida inicia-se logo após a concepção, num simples sopro divino. Nem mesmo Tomás de Aquino, um dos pais da Igreja, levou esta situação a tamanho extremo. Nos escritos do teólogo do século XIII, há a defesa de que a vida humana só começa aos 40 dias depois da fecundação. Para a ciência não há consenso, mas os cientistas sérios não costumam dar ao feto os direitos constitucionais que protegem os seres humanos em sua forma completa. Sendo assim, a Igreja que reclama o direito do feto, só os faz por conta de suas convicções subjetivas de fé, sem qualquer amparo científico.

Veja bem, ninguém de bom caráter e boas faculdades mentais incentivaria uma campanha a favor do aborto. Tal prática é recurso último e indesejado pela mulher. O trauma de submeter seu corpo a situações de risco só pode ser explicado na medida em que tais mulheres, pobres em sua maioria absoluta, desconfiam por completo das capacidades do Estado de lhe garantir vivência social saudável e segura. Ser mãe deveria ser uma escolha da mulher, e ainda sim com a segurança de proteção social do Estado, e não uma imposição. A soberania do corpo da mulher não pode ser violada e colocada sob situação penal.

Em países como Cuba e Uruguai, onde o aborto foi descriminalizado, não houve uma chacina de bebês, como alardeiam os fundamentalistas. Por lá começa a se construir uma consciência de direitos, liberdades e responsabilidades. Morrem menos mulheres, e as políticas de educação avançam, com perspectivas de que gravidezes indesejadas diminuam significativamente.

No Brasil a pressão religiosa e dos setores conservadores da sociedade é grande. E num país de maioria crente e com tendências conservadoras, fazer da descriminalização do aborto uma realidade requer esforços.
















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