O comunismo brasileiro foi gerado muito mais pelo impacto da revolução russa do que pela influência das ideias de Marx. Sem um partido socialista, que criasse uma dissidência, os fundadores do PC brasileiro saíram do seio anarquista, mesmo assim nos legando preciosos cérebros militantes, para cultura e para os desafios que nos trazia a industrialização brasileira.
Mas hoje, pouco mais de duas
décadas do desaparecimento do PCB, convertido em PPS e ampliado ideologicamente
pelo valor civilizatório da democracia política, preserva-se entre nós o
vocabulário anacrônico que guiou as fracassadas e exitosas aventuras
bolcheviques do início século XX. Estranha nos, ainda, que convivamos com a proclamação
do caráter puramente burguês da democracia, da concepção de Estado como mero “comitê
executivo das classes dominantes” e da ansiosa expectativa para o triunfo da “ditadura
do proletariado”.
A ocidentalização de nossa
sociedade, visivelmente, não comporta tais discursos sem isolá-los a grupos
ultra-minoritários, porém, persistentes, convictos que estão ao lado do “verdadeiro
marxismo”, contra o “revisionismo” dos reformistas traidores da esquerda.
Desde a Declaração de Março de
1958, documento que reconciliou socialismo e democracia, que as disputas
internas do comunismo tupiniquim trazem prejuízos e atrasos para a construção
de uma esquerda genuinamente democrática. O “marxismo-leninismo” em sua versão
dogmática e até stalinista, ainda nos oferece cenários e interpretações
bisonhas sobre o futuro do Brasil, que como nas previsões do “profeta Marx”,
assim como todo o mundo, teria o comunismo como ruptura da pré-história.
O esforço, na opinião deste
autor, não deveria ser apenas de convencer os comunistas a uma incorporação de
corpo e alma à democracia política ( não como um caminho “para” o socialismo,
mas um caminho “do” socialismo, como alertou um dos últimos documentos do saudoso
Partido Comunista Italiano), mas, principalmente, de abandonar perspectivas
teleológicas, como a que prevê a inevitabilidade do socialismo.
O socialismo passaria a ser referência
ética para uma nova humanidade, forma de regulação para um modo de produção que
atenda a radicalização da democracia, do fim das grandes desigualdades, da
elevação cultural dos povos para o autogoverno. Tudo, é claro, sem
necessariamente responder pelos “ismos” dogmáticos, sem precisar representar
fielmente a utopia original. A sociedade a ser perseguida não responderia por
projetos finalísticos, mas pela convicção inabalável que o futuro superior das
sociedades se dará por caminhos de convivências cívicas, sem a esperança
inegociável de um paraíso detalhadamente profetizado.
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