Recentemente, o mundo foi
abalado por uma série de revoltas populares. Primeiro na Tunísia, depois no
Egito, Iêmen, Bahrein, Líbia, Síria, Islândia, EUA, Espanha, Grécia, Chile e
Brasil. Em comum está o uso da internet como principal ferramenta de mobilização.
Há diferenças, é verdade. Partes
destes movimentos se deram contra ditaduras históricas, enquanto outros eclodiam
em democracias parlamentares com relativa estabilidade. A reação dos governos,
obviamente, se deu por variadas formas. Em casos como Líbia e Síria,
instalou-se uma guerra civil. Nos demais o uso da violência policial só fez por
fazer crescer o movimento.
Estes novos movimentos não só
não foram organizados por partidos e sindicatos, como estes eram frequentemente
hostilizados nos protestos. A organização dos atos se dava de forma horizontal
e sem lideranças. Por um lado isso dificulta a repressão e a cooptação, por
outro, cria problemas na hora de fazer suas reivindicações virarem concretas.
Na maioria dos casos se reivindicava tudo e ao mesmo tempo nada. Na Tunísia
conseguiu-se alguns avanços democráticos, na Islândia uma nova Constituição foi
criada com participação virtual das pessoas. No restante, contudo, pouca coisa
mudou. Seria a prova de que tais movimentos são pouco produtivos no processo de
transformação social?
O fato é que o espírito indignado
que tomou às ruas de forma espontânea rejeita categoricamente o sistema
político institucional. Motivo pelo qual nenhum partido ou organização coletiva
saiu destes processos. Os manifestantes traziam individualmente suas revoltas,
mas propostas e reivindicações não conseguiram encontrar caminhos de mediação
para sua realização. A internet mostrou eficácia ao inflar a revolta das
pessoas, deixar nu a repressão do Estado, utilizando-se de vídeos no youtube,
rapidamente reproduzidos nas redes sociais. Todavia, não serve como instrumento
de transição da revolta para a realidade.
Muitos dizem que as mudanças começam
a acontecer na cultura e nas mentalidades. Pode ser. Mas é também preocupante
que a frustração tome conta da sociedade na medida em que tanto sacrifício não
consegue sequer dar passos de melhorias na vida política, social e econômica de
um país.
A sociedade conectada em rede
tem um enorme potencial. Haja vista a forma rápida com que a informação
circula. Deve-se, no entanto, reavaliar se ela está pronta para reorganizar o
mundo dispensando os organismos coletivos tradicionais. Parece-me que não.
Mesmo as mais descentralizadas formas de mobilização virtual carregam riscos.
Como o de não conseguir se tornar real, de não se transportar do ciberespaço
para o mundo urbano. Além do mais, ela ainda não conseguiu chegar às classes
mais baixas da pirâmide social. Os excluídos ficam, assim, órfãos de uma
organização que lhe dê voz. Não é a toa que o perfil da maioria destes novos
movimentos é composto de universitários, jovens com curso superior e a classe
média emergente. Os pobres ainda não estão conectados.
Talvez, o melhor caminho seja
combinar toda esta energia que emerge das redes, com processos de construção de
consenso trabalhados no espaço da democracia política. Com isso, é possível reinventar
os órgãos de representação, fazendo-os mais democráticos, ao mesmo tempo em que
viabilizará avanços reais nas demandas da sociedade. É preciso, assim, tomar a
democracia institucional como lugar de resolução dos conflitos e construção de
sínteses civilizatórias. Ignorá-la, como sendo esta, fonte de interesses
exclusivos das classes dominantes é um erro estratégico no qual poderemos pagar
caro no futuro.
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