quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Deus proteja o Estado laico

Por Adelson Vidal Alves


A carta de 1988 é republicana e protege as liberdades religiosas. Proíbe a interferência do Estado nas várias formas de manifestação de fé, seja para reprimir ou incentivar. As democracias modernas são laicas, ou seja, detém em sua jurisdição maior uma separação entre poder público e religião.

Estranho anacronismo, contudo, é o aparecimento cada vez maior de bancadas religiosas no Congresso Nacional. Elas se movimentam em território público munidas de convicções absolutas de fé. Usando os mecanismos institucionais do poder, tentam impor leis e dispositivos legais que caracterizam claramente proselitismo religioso. Tudo financiado pelos tributos do povo.

O avanço de direitos civis para os gays, as pesquisas com célula tronco, a descriminalização do aborto, temas contemporâneos e de interesse da modernidade, são barrados por versículos de textos sagrados e por amplas mobilizações públicas de quem porta o livro de Deus ao invés da Constituição debaixo do braço.

A construção de associações religiosas que penetram no poder estatal cresce cada dia mais. Partidos políticos, ONGs, meios de comunição e pastorais, já se utilizam de amplas esferas públicas para arrebanhar fiéis, dentro de uma verdadeira guerra religiosa. A pauta do Estado democrático de direito, passa agora, a depender da aprovação de Jeová, Alá ou Buda.

As manifestações religiosas em quintal laico são constantes, e vai desde a cantoria gospel até sessões mediúnicas em pleno ambiente parlamentar, abençoadas pelo crucifixo gigantesco que desafia a laicidade republicana.

Não bastasse o evangelismo parlamentar, o poder Executivo também abre suas portas ao metafísico. O fortalecimento de partidos com influência religiosa faz desembocar nos governos Ministros e secretários embutidos de política sacra. Utilizam de seus cargos para avançarem em sua ética divina, e colocam instituições democráticas para funcionarem como espaços litúrgicos de suas certezas religiosas.

Para que a democracia institucional permaneça avançando, se faz urgente uma intervenção dos órgãos fiscalizadores nos vários organismos de funcionamento do Estado. Este deve garantir a livre expressão da pluralidade cultural da fé, mas jamais tolerar que o Deus de alguns prevaleça sob a égide do direito democrático.


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