domingo, 1 de dezembro de 2013

ESQUERDA E DEMOCRACIA

Por Adelson Vidal Alves

Às vésperas do golpe militar de 31 de março de 1964, o Brasil vivia um ambiente de assanhamentos autoritários, à esquerda e à direita. A primeira desistira de conduzir seu programa, as reformas de base, por dentro do ordenamento institucional existente, insinuando frequentemente atropelar as regras do jogo. A segunda convertera-se à paranóia que circulava pela Guerra Fria, alardeando o risco de um golpe comunista no país. A tensão do momento produziu 21 “anos de chumbo”

Para resistir ao regime ditatorial, a esquerda se dividiu, parte dela recorreu às armas, sem conseguir grandes contribuições, pelo contrário, forneceu elementos para o aprofundamento da repressão governista. O retorno à democracia se deu pela ação conjunta de múltiplos atores sociais no campo da sociedade civil, organizados numa frente ampla contra a ditadura. A estratégia era “derrotar” e não “derrubar” o regime”.

A redemocratização, assim, se deu com a participação heterogênea do campo democrático. Reuniam-se neste grupo empresários, sindicatos, Igreja, movimentos sociais etc. A esquerda conseguiu certo consenso, mas ainda sim uma parte significativa tratava a democracia como uma necessidade tática para a transição ao socialismo, e não como valor universal, o que enfraqueceu a construção de uma esquerda democrática forte, que até hoje nos traz sérios prejuízos.

As Jornadas de Junho, por exemplo, que levaram milhões de pessoas às ruas, não conseguiram trazer grandes conquistas para o aprofundamento democrático, pior, facilitou o aparecimento de grupos anacrônicos,  em flerte com o fascismo e cheios de apreço pela violência desmedida e anti-democrática, que não se contentava com a propriedade, atingia pessoas.

Para piorar, a esquerda hegemônica a 10 anos, do posto maior da República, atua para desestabilizar a institucionalidade democrática, sendo orquestrando campanhas de injúria contra o STF, desobedecendo a decisões judiciais ou denegrindo a imprensa, tratada como “golpista”.

Tudo isso atesta a ausência de uma esquerda democrática no país, o que tem facilitado não só a presença de elementos autoritários em nossa cultura, mas, principalmente, dando cobertura a permanência de uma baixa política, resumida a questões do cotidiano, sem preocupações estruturais.

A tarefa de redefinir um campo democrático de atuação da esquerda é urgente. A democracia é conquista civilizatória, lugar seguro e exclusivo para se caminhar transformações substantivas.

A presença de uma esquerda simpática à “ditadura do proletariado” mostra certo atraso na adaptação de nossas forças progressistas ao mundo contemporâneo. Para caminharmos rumo a uma nova ordem social justa e solidária, é preciso que toda a esquerda incorpore a democracia política como ponto inegociável em suas utopias. O caminho, porém, parece ainda estar bem no princípio.

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