sexta-feira, 17 de maio de 2013

Gramsci e a América Latina



Por Adelson Vidal Alves


Gramsci deu pouca atenção a América Latina em seus escritos. Em uma das raras vezes em que citou países do continente, inclusive o Brasil, o fez usando da velha esquemática ortodoxa da III internacional. Em uma nota, datada de 1932, o comunista sardo lança mão da tese de que os países do Sul eram todos “semi-feudais”, e para usar de seu próprio conceito, países “orientais”, ou seja, países subdesenvolvidos e com uma frágil sociedade civil.

O continente estaria, assim, sob a orientação da “guerra de movimento”, isto é, exposto a estratégia de uma revolução insurrecional num curto espaço de tempo, com o objetivo final de tomar o estado de assalto.

Nosso autor não chegou a utilizar outros de seus preciosos conceitos, como o de revolução passiva, para poder interpretar a realidade não só da América Latina, mas de todas as sociedades do sul. Coube então a seus seguidores reinterpretarem nossa realidade. Não como sendo um continente abundante em orientalismo, mas sim de transformações pelo alto. Citamos assim a revolução mexicana, o peronismo e o varguismo como exemplos de revoluções passivas, e que apesar de se apoiarem no protagonismo do Estado, conseguiram se desenvolver para realidades “ocidentais” no qual se constituiu sociedades civis relativamente estáveis. Tal caracterização é extremamente importante, pois a partir dela podemos refletir processos de mudanças estruturais se utilizando da estratégia de “guerra de posição” onde as forças revolucionárias passariam a assim a se guiar por um processo molecular de mudanças, e não uma ruptura abrupta.

No entanto, o processo de “ocidentalização” do continente não significa a extinção de contradições nas particularidades de cada nação latino-americana. Muitas delas poderiam ainda ser caracterizadas como sendo “ocidentes periféricos” sendo ainda objetos de dependência econômica dos países do norte. Tal dependência, fruto do imperialismo contemporâneo, obedece a junção de coerção e consenso, haja vista que os países dominadores não se utilizam apenas da força para obter seu domínio, mas também ao propagar seu estilo de vida como sendo o mais avançado. Vejam só os EUA, que mantém a Quarta-frota ameaçando nossa soberania, mas por outro lado invade o cinema, a arte e influencia nossos comportamentos com via a obter consenso. Até aí os conceitos de Gramsci nos são úteis.

O fato, ainda que paradoxal, é que a América Latina acolheu com força o teórico italiano, sobretudo Argentina e Brasil. Nosso país hoje é um dos maiores leitores de Gramsci, e dificilmente veremos alguma força política se movimentando sem se utilizar de alguma conceituação gramsciana.

Podemos afirmar com toda certeza que as categorias gramscianas permanecem atuais para nossas análises contemporâneas. Vejam por exemplo as vitórias eleitorais de governos opositores aos modelos clássicos do neoliberalismo, como o de Evo Morales na Bolívia, Chavez na Venezuela e Rafael Correa no equador. A meu ver, seriam todos resultados de revoluções passivas.  E quanto ao Brasil? Não estariam os governos petistas sob forte impacto do “transformismo”?

Enfim, o espaço aqui é curto para entrarmos em um debate tão complexo. Mas de minha parte, não tenho dúvidas quanto a validade da teoria política de Gramsci para a América Latina, ou seja, o teórico das revoluções no ocidente recebeu abrigo prolongado em nossa terra. E tudo indica que sua estadia será longa por aqui.

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