Por Adelson Vidal Alves
Gramsci deu pouca atenção a
América Latina em seus escritos. Em uma das raras vezes em que citou países do
continente, inclusive o Brasil, o fez usando da velha esquemática ortodoxa da
III internacional. Em uma nota, datada de 1932, o comunista sardo lança mão da
tese de que os países do Sul eram todos “semi-feudais”, e para usar de seu
próprio conceito, países “orientais”, ou seja, países subdesenvolvidos e com
uma frágil sociedade civil.
O continente estaria, assim,
sob a orientação da “guerra de movimento”, isto é, exposto a estratégia de uma
revolução insurrecional num curto espaço de tempo, com o objetivo final de
tomar o estado de assalto.
Nosso autor não chegou a utilizar
outros de seus preciosos conceitos, como o de revolução passiva, para poder
interpretar a realidade não só da América Latina, mas de todas as sociedades do
sul. Coube então a seus seguidores reinterpretarem nossa realidade. Não como
sendo um continente abundante em orientalismo, mas sim de transformações pelo
alto. Citamos assim a revolução mexicana, o peronismo e o varguismo como exemplos
de revoluções passivas, e que apesar de se apoiarem no protagonismo do Estado,
conseguiram se desenvolver para realidades “ocidentais” no qual se constituiu
sociedades civis relativamente estáveis. Tal caracterização é extremamente
importante, pois a partir dela podemos refletir processos de mudanças
estruturais se utilizando da estratégia de “guerra de posição” onde as forças
revolucionárias passariam a assim a se guiar por um processo molecular de
mudanças, e não uma ruptura abrupta.
No entanto, o processo de
“ocidentalização” do continente não significa a extinção de contradições nas
particularidades de cada nação latino-americana. Muitas delas poderiam ainda
ser caracterizadas como sendo “ocidentes periféricos” sendo ainda objetos de
dependência econômica dos países do norte. Tal dependência, fruto do
imperialismo contemporâneo, obedece a junção de coerção e consenso, haja vista
que os países dominadores não se utilizam apenas da força para obter seu
domínio, mas também ao propagar seu estilo de vida como sendo o mais avançado.
Vejam só os EUA, que mantém a Quarta-frota ameaçando nossa soberania, mas por
outro lado invade o cinema, a arte e influencia nossos comportamentos com via a
obter consenso. Até aí os conceitos de Gramsci nos são úteis.
O fato, ainda que paradoxal, é
que a América Latina acolheu com força o teórico italiano, sobretudo Argentina
e Brasil. Nosso país hoje é um dos maiores leitores de Gramsci, e dificilmente
veremos alguma força política se movimentando sem se utilizar de alguma
conceituação gramsciana.
Podemos afirmar com toda
certeza que as categorias gramscianas permanecem atuais para nossas análises
contemporâneas. Vejam por exemplo as vitórias eleitorais de governos opositores
aos modelos clássicos do neoliberalismo, como o de Evo Morales na Bolívia,
Chavez na Venezuela e Rafael Correa no equador. A meu ver, seriam todos
resultados de revoluções passivas. E
quanto ao Brasil? Não estariam os governos petistas sob forte impacto do
“transformismo”?
Enfim, o espaço aqui é curto
para entrarmos em um debate tão complexo. Mas de minha parte, não tenho dúvidas
quanto a validade da teoria política de Gramsci para a América Latina, ou seja,
o teórico das revoluções no ocidente recebeu abrigo prolongado em nossa terra. E
tudo indica que sua estadia será longa por aqui.
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