segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A naturalização da corrupção



Por Adelson Vidal Alves

No domingo, 1 de Setembro, o programa Fantástico da rede Globo apresentou reportagem sobre um possível esquema de corrupção envolvendo parlamentares no aluguel de veículos com uso de recursos públicos. Segundo denúncias, 21 deputados estariam usando empresas de fachadas na execução dos serviços. O caso já está sob investigação dos órgãos competentes.

Pois bem, a matéria do programa causou espanto entre os telespectadores. Não só por conta da possível comprovação de mais um caso de corrupção via agentes públicos, infelizmente, abundante nos noticiários nacionais. Mas, principalmente, por conta da forma como tudo foi visto pelo olhar de um dos parlamentares: Jorge de Oliveira, o Zoinho (PR). O deputado fez duas declarações lamentáveis. Na primeira ele é enfático: Dizer para você que eu sou 100% honesto... 100% honesto só Jesus Cristo” para depois complementar "Santo em Brasília, não existe. Da fronteira do Distrito Federal com os outros estados, eles não entram".  Ao invocar Jesus Cristo como o único 100% honesto, Zoinho atribui a honestidade total como sendo de atributo exclusivo dos seres divinizados, para depois frisar que em Brasília todos os deputados cometem desvios de condutas. A repercussão das infelizes declarações causou uma debandada de seus apoiadores e eleitores, mas teve ainda quem tratasse o assunto como “tempestade em copo d’água”. Para muitos, Jorge de Oliveira foi “sincero” em suas colocações. Nem mesmo o guru de Zoinho chegou a tanto. O deputado Anthony Garotinho lamentou em plenária a generalização feita pelo parlamentar.

O fato, porém, é que Zoinho tratou o câncer da corrupção como sendo algo inerente a natureza humana e social. Estaríamos todos reféns de um “fatalismo” que levaria inevitavelmente o conjunto da humanidade ao desvio ético. A afirmação partiu de quem menos poderia fazê-la, ou seja, um representante público, eleito pelo povo.

Sabemos que a corrupção tem raízes sociais. Ela se sustenta em meio a um sistema político-eleitoral que permite a interferência do poder econômico nos mandatos e candidaturas, que oferece benesses excessivas a deputados, vereadores, prefeitos e presidentes. Que faz do posto de serviço público uma fonte inesgotável de poder. O que faz da picada da mosca azul um risco constante. Contudo, não significa que todos os que assumam postos de representação sejam obrigados a se corromper e que estejam sob o determinismo de praticarem atos ilícitos. As afirmações de Zoinho prestam terrível desserviço pedagógico, difundindo ao senso comum o trágico sentimento que ninguém escapa a corrupção. De que adiantaria combatê-la se ela estaria no DNA dos indivíduos e das instituições? É essa a mensagem que passa o parlamentar.

Em tempos onde as multidões se lançam ás ruas cobrando transparência pública, mirando as instituições como principais responsáveis pela roubalheira do patrimônio público, Zoinho só vem a reforçar a alienação política e o preconceito contra os pilares da democracia representativa. Suas palavras, em rede nacional, enfraqueceram ainda mais os órgãos institucionais que sustentam nossa democracia. Em poucas palavras, Jorge de Oliveira conseguiu expor a todo o Brasil a desalentadora notícia de que a corrupção é algo que não tem fim, afinal, todos de certa forma seriam desonestos. Triste !

Um comentário:

  1. "Nós vos pedimos com insistência:
    Nunca digam: -Isso é natural!
    Diante dos acontecimentos de cada dia.
    Numa época em que reina a confusão.
    Em que corre sangue.
    Em que o arbitrário tem força de lei.
    Em que a humanidade se desumaniza...
    Não digam nunca: -Isso é natural!
    A fim de que nada passe por ser imutável."
    Bertold Brecht

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