terça-feira, 12 de março de 2013

Jesus e Marx



Por Adelson Vidal Alves

Dois judeus, um da palestina do século I e o outro da Europa do século XIX, ainda tem seus legados teóricos e de vida muito vivos em nossos dias. O primeiro, Jesus de Nazaré, foi assassinado como condenado político, resultado de sua atuação contra o poder estabelecido, tanto religioso como secular. O segundo, Karl Marx, viveu como intelectual e teórico de uma nova sociedade, pelo qual se empenhou com fortes críticas ao sistema dominante.
Jesus, segundo relato dos evangelhos, colocou como condição de ser seu discípulo a opção preferencial pelos excluídos, tomados como portadores especiais da mensagem divina. Defendeu ainda a construção de uma nova ordem social, que chamou de Reino de Deus, no qual a solidariedade, justiça e fraternidade fossem o centro de seu núcleo civilizatório.
Karl Marx também defendeu uma nova organização social, que chamou de comunismo. Nela os elementos que emperram nossa plena humanização seriam abolidos, tais como a alienação, a propriedade privada dos meios de produção e a exploração do homem pelo homem. O alemão desenvolveu uma sofisticada teoria política, que elegeu os trabalhadores como sujeito revolucionário do sistema, inclusive com o emprego da violência. Jesus se ocupou de uma mensagem de libertação, que apelava às consciências a transformação radical da sociedade. Concentrou-se num discurso ético contra a exploração da vida social.
Jesus era um típico judeu, um religioso. Marx era ateu materialista. Ambos, contudo, compartilhavam a utopia de uma sociedade que partilhasse os bens produzidos. Se o comunista alemão produziu uma refinada teoria de produção e apropriação socializadas dos bens produzidos, o nazareno usou da metáfora da ceia e da multiplicação dos pães para denunciar um mundo que furtava de grande parte de seus habitantes o direito mais básico de um ser humano: o de comer. A Santa ceia simboliza a partilha dos alimentos, e a multiplicação dos pães a tomada de iniciativa para fazer com que a justiça seja feita aos famintos da terra.
Jesus e Marx guardam ainda o discurso forte contra os ricos. O primeiro chega a afirmar “ai dos ricos” (Lc 6-24) uma expressão de condenação veemente usada pelos profetas da época, enquanto Marx desvenda minuciosamente o processo de enriquecimento da burguesia em exploração aos trabalhadores, consolidada na famosa teoria da “mais valia”.
Karl Marx e Jesus “O Cristo” guardam, obviamente, diferenças históricas. Mas não podemos negar que entre eles há convergências utópicas quanto ao sonho de uma nova sociedade. Para se ter uma idéia, seus discípulos autênticos assumiram frentes comuns na luta contra a injustiça, que o diga as resistências às ditaduras, a revolução sandinista na Nicarágua e as fantásticas CEBs (Comunidades Eclesiais de Base) fruto da teologia da libertação da América Latina, no qual Marx cumpre importante papel de análise da realidade.
Para terminar, não podemos deixar de identificar seus falsos discípulos. Os cristãos que condenam o marxismo por esse ser ateu, esquecendo-se que para Jesus é a prática que determina seu discipulado (Mt 25, 31-46) , e também os comunistas, que no poder em alguns países, proibiram o culto religioso, argumentando ser este “ópio do povo”.  Nesses casos, o dogmatismo impediu que se veja a verdadeira essência das duas doutrinas, ambas humanistas e libertadoras.

Um comentário:

  1. Até que enfim alguém escreveu um texto tão importante a respeito do que há de comum entre esses dois importantes personagens da história da humanidade.

    Parabéns !!

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