quinta-feira, 22 de março de 2012

Deus é feio, mas me ama.

Por Adelson Vidal Alves


Escrevi um pequeno texto em meu blog intitulado “Deus é feio”, que teve relativa repercussão em meu círculo de amigos.  Acho que cometi um erro, quando propus uma temática  tão polêmica usando de um espaço pequeno. Recebi críticas ferrenhas e esperadas de muitos cristãos, mas estranhamente também de ateus e agnósticos. Mais uma vez consegui a proeza de não agradar ninguém.

Pois bem, o artigo que agora apresento, não tem nenhuma pretensão de acabar com estes desagrados, mas principalmente tentar clarear uma posição pessoal que ora tomo sobre minha fé. Aos ateus cientificistas não creio que tenha alguma utilidade, aos religiosos convencidos de uma verdade imutável, tão pouco. Ele é fruto de uma reflexão íntima que transformou muito a ideia de Deus que tinha.

Inicio dizendo que não sou daqueles que aguardam ansiosamente a comprovação definitiva da ciência sobre Deus. Minha fé na divindade é algo que brota do meu interior e que dispensa qualquer necessidade de comprovação ou evidência científica. Aliás, acho que a fé é isso, crer sem exigir contrapartida.

Contudo, a fé não está necessariamente divorciada da ciência. Quando lemos um livro, julgamos imediatamente o caráter do autor, e ainda que não o conheçamos, fazemos nossas considerações íntimas sobre ele. Deus não cabe na lente de um microscópio, como disse Leonardo Boff “O dia que a ciência encontrar Deus, teremos a prova de que ele não existe”. Todavia, a criação divina não ficou oculta e através de mecanismos desenvolvidos por nossa razão, podemos hoje entender um pouco de como tudo surgiu sem precisar consultar um guia espiritual.

A proposta do primeiro artigo não era confessar minha conversão ao “ateísmo”. Mas (sim! confesso), chocar de alguma forma os tantos crentes que vão ao extremo de uma fé conformista. Se a ciência vem demonstrando que na criação estão presentes sinais de desordem e imperfeição, temos o direito de questionar porque ainda insistimos em pintar Deus como uma mistura de Superman e Gênio da Lâmpada. Ou seja, forte e com atributos de resolver todos os nossos problemas.

Porque será que exigimos de Deus a perfeição, a beleza, a simetria e a força? Seria ele, como sugerem os psicanalistas, apenas uma conversão de nossas frustrações? Uma espécie de ser modelado por tudo que desejaríamos ser e não somos? 
E se ele não for perfeito? Nem belo? Nem poderoso a ponto de controlar tudo que criou?

Tenho certeza que muitos crentes cairiam em total decepção se tais hipóteses se confirmassem, afinal, não se contentam com o amor que dele provém. Queremos uma proteção, um herói e heróis não são fracos, não perdem batalhas e estão sempre prontos para nos salvar do perigo.

Certa vez fui perguntado: “Porque Deus nos fez assim e não de outra forma?” Respondi que talvez o próprio Deus nos tenha feito por acidente, sem ter previsto o resultado de sua obra.

Sabe aqueles chutes no futebol que parecem ir à torcida adversária, mas de repente esbarram na cabeça de alguém e se transforma num golaço? Pois é, de repente somos este golaço. Nós e todo o cosmos podemos ser frutos desta casualidade. Não seríamos, assim, criaturas projetadas, mas simplesmente resultado do acaso.

Deus, nesta perspectiva, não teria controle sobre o que criou. Não intervém em seu próprio acidente. Não age com certezas, erra com a gente, sofre com agente, numa prova clara de amor e cumplicidade. Este Deus se entrelaça em nossa mente e em toda a criação.

Peço desculpas por não ter certeza, por meus conflitos cotidianos e talvez até por curiosidades desnecessárias.

Não escrevo para convencer ninguém sobre minha fé e muito menos ferir a esperança dos que se contentam com a revelação hebraica de Deus. Até porque, ainda me restam forças para dizer que sou cristão, ainda que não comungue, não me confesse e muito menos frequente missas dominicais. Sou cristão porque creio no Deus revelado por Jesus, confirmado em sua encarnação humana em um pobre, que viveu, sofreu e morreu como um marginal, bem longe das perspectivas perfeccionistas de nossa cultura.

Revisão textual: Regina Vilarinhos

2 comentários:

  1. Bela exposição dos próprios conflitos. Meio desabafo, meio autobiográfico, meio Adelson, meio Del... enfim...

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  2. Prigogine (Cientista fisico-quimica) se interessava pela “dinâmica dos sistemas longe do equilíbrio”; trata dos fenômenos irreversíveis e das estruturas dissipativas.
    Descobre em suas pesquisas que a ordem pode nascer da desordem.

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