domingo, 4 de março de 2012

PCB 90 anos: Disputa pela memória

Por Adelson Vidal Alves


            Em Março de 1922, nascia o PCB (Partido Comunista do Brasil). Ao contrário dos comunistas argentinos, que já se organizavam em partido desde 1918, através de uma ruptura à esquerda com o Partido Socialista, o PC do Brasil foi fundado por militantes predominantemente de origem anarcosindicalista, já que neste momento não havia no país um Partido Socialista .
            No ato de fundação, havia 9 militantes, que se reuniram no Rio de Janeiro e em Niteroi entre os dias 25, 26 e 27 de Março. Os fundadores representavam 73 filiados de todo o país, que haviam se convertido ao comunismo. A maioria dos primeiros dirigentes do "Partidão" não conheciam a fundo o marxismo, estando muito mais próximos dos desdobramentos da revolução de Outubro, do que do rigor teórico do marxismo. Conta-se que após o encontro, os participantes entoaram a Internacional Comunista em voz baixa, afim de não acordar as tias do fundador Astrojildo Pereira, donas da casa em que se finalizava o Congresso.
            A debilidade de nosso marxismo e a absorção acrítica dos documentos ortodoxos da URSS, legou uma história oscilante do PCB, que ora prestava formidável contribuição a cultura nacional e ao movimento operário, e em outro momento caia em sectarismos infantis, quando no episódio do conhecido "obreirismo", momento em que o partido expulsa intelectuais da direção , insistindo na centralidade da direção revolucionária na mão da classe operária. Malgrado oscilações as vezes bizarras, não se pode pensar a formação do Brasil contemporâneo sem que se coloque os comunistas brasileiros como protagonistas das principais lutas de nossa soberania nacional.
            Neste ano de 2012 em que se completa 90 anos de fundação do PCB, uma polêmica surge nos meios políticos e acadêmicos. Pelo menos dois partidos reinvindicam o direito a sua memória de origem: O PC do B (que manteve-se como Partido Comunista do Brasil), hoje base do governo Dilma e o PCB (Partido Comunista Brasileiro) uma agremiação pequena e com pouca influência nos setores operários.
            A discussão começa já em 1956, ano em que se realiza o XX Congresso do PCUS, e momento no qual são denunciados os crimes de Joseph Stalin. Os ecos da discussão do congresso racharam o PCB em dois grupos. De um lado os que defendiam uma auto-critica pública sobre os desvios Stalinistas, e do outro, àqueles que permaneciam firmes em favor da ortodoxia partidária. Entre estes últimos estavam João Amazonas, Diógenes Arruda e Mauricio Grabois, uma espécie de núcleo duro do que viria ser mais tarde o  PC do B.
            Amazonas, Grabois, Arruda e outros, seriam afastados dos cargos de direção em Agosto de 1957, numa reunião do Comitê Central, acusados de serem os responsáveis pelo sectarismo de tempos anteriores.
           Os conflitos entre os dois grupos se agravou em 1958, depois da divulgação da chamada "Declaração de Março de 58". Neste momento, a direção do PCB apresenta uma nova e correta estratégia de revolução no Brasil. Deveria-se a partir daí, segundo o documento,  concentrar forças em lutas graduais e eleitorais, retirando por completo a perspectiva insurrecional e guerrilheira. Tal estratégia, a unica possível para a revolução em país complexos como o Brasil já naquele momento, foi nomeada por Gramsci de Guerra de posição.
           João Amazonas e seu grupo, contudo, denunciavam o que eles chamaram de "revisionismo" e seguiram ainda mais rapidamente para um processo de ruptura, que se concretizou em 1962, quando foi lançada a "Carta dos cem", uma espécie de manifesto  contra as mudanças estatutárias propostas pela direção. Os rebeldes foram expulsos e vieram a fundar o PC do B.
           A existência de dois partidos comunistas no Brasil, apesar dos enfrentamentos originais, viria se caracterizar por uma coexistência relativamente harmoniosa. O PC do B caminhou para uma linha mais extremista, e chegou a organizar guerrilhas para resistir ao golpe militar de 1964, como a Guerrilha do Araguaia. Assim como os outros grupos da esquerda armada, foram massacrados pelas forças da repressão, onde ficou claro o equivoco interpretativo do grupo de Amazonas, que não conseguiam enxergar a complexidade de nossa realidade nacional, no qual não cabia luta armada dentro de uma estratégia maoista conhecida como "Guerra popular prolongada". O PC do B demorou vencer seu sectarismo chegando a ter a Albânia como farol da revolução mundial.
           A disputa pelo legado de 1922, talvez exija mais tempo e espaço para debates. Ainda que os argumentos do PC do B de hoje, se sustentem muito mais em saudosismos do que em referências históricas. Mas nem por isso o partido de Jandira feghali, Renato Rabelo e Aldo Rebelo, deixarão hoje de comemorar os 90 anos. Mais do que a disputa pela memória se faz necessário uma reflexão ampla sobre os rumos do comunismo brasileiro, que hoje me parece as escuras.

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