Por Adelson Vidal Alves
A consolidação das democracias modernas se deu em meio a luta de classes. A burguesia como classe dirigente, depois de alcançado seus objetivos, trabalhou duro para combater a expansão da democratização. Os primeiros governos ditos liberais resumiam a democracia a um caráter meramente representativo, com mecanismos elitizados de escolha e sufocamento dos espaços de participação popular. Conquistas como o sufrágio universal, o pluripartidarismo, a livre associação sindical e a liberdade de imprensa são frutos de luta das classes subalternas.
Há alguns marxistas que ainda hoje pensam a democracia como uma etapa estratégica para a conquista do poder proletário. Para isso se utilizam dos textos de Marx e Lênin, que caracterizam a democracia como uma ditadura disfarçada da burguesia, e que para tal deveria ser utilizada como forma de luta, mas suas instituições destruidas na medida em que os trabalhadores chegassem ao poder.
As instituições democráticas modernas são resultados de uma longa batalha social por maior socialização do poder. O parlamento, os governos eleitos pelo voto direto, os sindicatos e a midia são orgãos de disputa pelas classes populares, organismos indispensáveis para a garantia da participação do povo nas grandes decisões da nação. Precisam ser amadurecidos, aperfeiçoados, repensados, mas jamais destruidos. A expansão do capitalismo não só criou as bases econômicas para a construção do socialismo como também estabeleceu alicerces políticos para a consolidação de uma nova ordem social em conformidade com uma democracia plena.
Nossa luta pelo socialismo, assim, não deve ser contra a democracia, mas por dentro dela e com ela. Devemos lutar por reformas que cada vez mais dinamizem uma cultura de autogestão, de participação direta na esfera do poder das camadas excluidas e de uma democratização social, econômica e cultural.
Descarta-se assim a possibilidade de uma revolução de tipo bolchevique, numa tomada abrupta do poder. O Estado moderno se difere do modelo que viveram Marx e Lênin, que teriam assim motivos de ver neles apenas um "comitê executivo das classes dominantes". Em sua forma atual ele se estende a uma esfera de ser social que Gramsci chamou de "sociedade civil", onde estão materializados a disputa hegemônica da ideologia, através dos "aparelhos privados de hegemonia", conceito gramsciano que engloba todos os orgão de difusão ideológica e de livre associação, tais como a igreja, a escola, midia, partidos politicos etc. Neste novo espaço estatal (já que percebemos claramente relações de poder) prevalece mecanismos de consenso, já que na complexidade das sociedades contemporâneas não se garante o poder apenas pela coerção. Gramsci observou bem que é na sociedade civil onde os socialistas devem travar a disputa primária pelo poder, tendo em vista que antes de ser classe dominante é preciso ser classe dirigente.
As forças sociais ligadas aos setores populares devem colocar assim na ordem do dia o aprofundamento da democracia em todo mundo, respeitando as realidades e limitações locais. Motivo pelo qual se torna incompreensivel o apoio de parte da esquerda ao ditador Kadaffi. Mesmo que em situação contestável a chegada de valores democráticos a Líbia é de longe um avanço em relação a ditadura sanguinária das ultimas 4 décadas.
No Brasil nossa jovem democracia precisa de ajustes e avanços, mas mostra significativa solidez, o que sugere que os lutadores de esquerda devam aproveitar estes avanços e travar uma luta por seu aprofundamento, que na prática significa uma luta pelo socialismo.