A prisão preventiva de 23 “manifestantes” pela Polícia
carioca provocou debate na sociedade e condenações por parte de entidades
internacionais e juristas respeitados. Para muitos, tratava-se de prisões
políticas, uma espécie de perseguição do Estado, que justificaria até mesmo um
pedido de asilo, como aconteceu com a advogada Eloisa Samy, que
recorreu ao governo Uruguaio e teve sua solicitação prontamente negada.
Para além de discussões técnicas e jurídicas, as questões
que envolvem esse caso chegam à política, tendo como centro a democracia. Mais
de 25 anos depois de promulgada a mais democrática Constituição de nossa
história, ainda temos quem recorra à violência como forma de manifestação. No
caso da prisão dos manifestantes, foram encontradas armas de fogo, material
para coquetel molotov e outras armas que podem causar ferimentos graves caso
atinjam alguém.
É de se lamentar que esse tipo de prática ainda receba apoio
de partidos de esquerda (na verdade da extrema-esquerda), estes que se
beneficiaram da socialização da política que nos levou ao moderno arcabouço institucional
democrático. Trata-se de uma ideologia que vê na violência ação legítima contra
o capitalismo. Acreditam que uma minoria pode assumir a linha de frente contra
o sistema. Para eles, a democracia seria
apenas a fechada da dominação burguesa. Ignora-se que já há algum tempo o
Estado direito comporta espaço propício para conquistas importantes das classes
subalternas.
O Brasil pôde, diante dos acontecimentos, conhecer os dois
lados deste debate. Um deles resolveu alardear um Estado de exceção atuando no
país, agindo contra a liberdade de manifestação. Deste lado estavam o PT ,
PCdoB e os nanicos da ultra-esquerda. Do outro ponto de vista estava quem
condenasse ações violentas e tomasse lado da nossa democracia que, mesmo
portando defeitos históricos, é plenamente capaz de proteger as liberdades
modernas via suas instituições. Neste aspecto ficou claro os que assumem a
democracia como uma preciosa conquista de civilização e os que estão preparados
para cancelá-la em nome de um projeto, ainda pouco esclarecido.
Percebe-se, ainda, a formação de uma “Esquerda Molotov”, que
prefere bombas químicas à Constituição. Este tipo de esquerda já se mostrou
negativa na história. Quem não se lembra das mortes promovidas pela resistência
armada à ditadura, feitas em nome do “Justiçamento”? Da Itália, então, vem um
exemplo ainda mais trágico. O chamado terrorismo vermelho chegou ao ponto de
sentir prazer na dor daqueles que consideravam inimigos ( muitos destes “inimigos”,
pertencentes aos quadros do Partido Comunista) atirando nas pernas dentro de uma prática que ficou conhecida como
Gambizzare.
Por lá também se defendiam dizendo que sua luta era por uma sociedade mais
justa.
Portar armas, agredir jornalistas, utilizar-se de bombas
contra pessoas, destruir patrimônios são atos que confrontam a lei. Coisa de
criminosos comuns.
Neste caso, deve se valer a Constituição e o Direito penal.
Não podemos aceitar retrocessos no trato da política. Esta tem lugar no Pacto
Constitucional, no aparato das leis, na cultura cívica e pacífica que caracteriza
uma democracia avançada. A existência de uma esquerda disposta a suspender o
Estado de direito é um anacronismo que só se explica pela história das nossas
esquerdas, quase sempre movidas por um espírito golpista. Esperamos com
esperança a construção de uma esquerda democrática, pois somente esta poderá
defender evoluções democráticas necessárias a um país ainda tão injusto
socialmente.