sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Neto x Zoinho: os sentidos da alternância do poder

Por Adelson Vidal Alves



Um dos pilares da democracia moderna que se reivindica é a chamada alternância do poder. A justificativa central se concentra no impedimento de que uma pessoa ou grupo político se perpetue no poder, impondo de forma excessivamente duradoura uma forma de governabilidade autoritária. No Brasil, a rotatividade no poder é garantida por uma lei que limita a reeleição de um candidato ao executivo a apenas uma vez. Não impede, contudo, que o mesmo partido do então candidato siga governando por tempo indeterminado.

É bom que se diga que a alternância do poder é fruto de uma visão liberal de democracia. É justificável porque a direita insista tanto neste discurso, já que alternando grupos no poder, se impede que um projeto político se consolide, ou mesmo que se tenha tempo para se praticar mudanças mais estruturais na sociedade. Não precisamos ir longe para entender a fúria da direita quando projetos alternativos e populares avançam no tempo e no poder. Hugo Chavez sofre forte pressão do imperialismo e da burguesia de seu país, sendo chamado de ditador, quando na verdade venceu todas as eleições por sufrágio universal, saindo vitorioso também em dois referendos revogatórios. Ainda sim é chamado de ditador.

O ex-presidente de Honduras, Manuel Zelaya, sofreu um golpe de Estado ao propor democraticamente um referendo que estendesse seu mandato. Lá também as oligarquias justificaram a alternância no poder para seqüestrar o então presidente, e cercar a embaixada brasileira quando esta deu asilo político a Zelaya. Trocando em miúdos: o discurso da alternância do poder também foi base para se estabelecer uma ruptura institucional no país.

É preciso ressaltar que o ponto fundador da democracia é a vontade popular. Desde os contratualistas liberais como Rousseau, até representantes do marxismo democrático como Gramsci, estabelece-se um consenso de que a legitimidade do poder se concretiza com a consolidação de consenso em torno de um projeto político. Rousseau chamou de “vontade geral” e Gramsci de “Vontade popular coletiva”. O que garante o sucesso democrático, não é a simples troca constante de governantes e partidos, mas sim a disputa legítima de projetos de poder, que Gramsci chamou de luta pela hegemonia”.

Bem, faço esta introdução para entrar no debate que circula as redes sociais e esferas públicas nas eleições do segundo turno da cidade. Há quem vote no candidato da oposição, o republicano Zoinho, com a justificativa superficial de que é preciso trocar o grupo político. Chama-se o atual prefeito de ditador, quando este chegou ao governo pelo voto popular.

Assusta-me, sobretudo, que a alternância do poder seja invocada aqui de forma ainda mais desqualificada. Não se estabelece um debate entre as características das duas candidaturas. Não se analisa o perfil de Zoinho, não se busca seu histórico político, suas alianças de classes, os apoios partidários que recebe, o financiamento que recebe do poder econômico, seus compromissos com o grande capital. O discurso se atenta para o simplista “é preciso mudar”.

Assim como golpes foram estabelecidos em nome da rotatividade do poder, por aqui se tenta construir a idéia que a democracia exige mudanças no poder, mesmo quando estas se dêem em prejuízo de uma cidade inteira.

Que esse discurso parta dos grupos fisiológicos da oposição, isto é natural. Mas surpreende quando indivíduos e segmentos ligados ao socialismo e a esquerda, adotam este argumento.

Há quem diga o absurdo de que é preciso retirar Neto para se fazer oposição a outro, simplesmente porque é preciso mudar. É bom sabermos que nem na literatura democrática, nem no marxismo, há parâmetros para sustentar tal tese.

Vai um apelo para que nos últimos dias desta campanha, que pelo menos se abra um debate mais qualificado, e que se avalie de fato o significado da vitória de ambos os candidatos. O sucesso democrático depende do perfil político que se estabelecerá no poder no município, e não  em um simples troca-troca.

Um comentário:

  1. Esse é o "debate mais qualificado" que precisamos. Parabéns pelo ponta-pé inicial, Adelson.
    Precisamos manter a memória afiada, principalmente para lembrarmos o que foi feito nos governos Wanildo de Carvalho e Paulo Baltazar. "moving forward not backward"
    Abraço.

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